De que se ocupa (ou com que se «pré-ocupa») o presidente da «liga dos bombeiros portugueses»?
As medidas para a prevenção de incêndios este ano divulgadas mediante correio normal e electrónico são técnica e ambientalmente criticáveis (para quê mandar abater as árvores que marginam as estradas, bastaria cortar o mato e desbastá-las, nos casos necessários, e limpá-las), mas há procedimentos de emergência justificáveis para evitar tragédias iminentes como eram as do ano passado (faixas de contenção junto de habitações e de povoados, por exemplo) e podem ser as deste ano, porque, depois do susto e do horror, o miolo de florestas e matagais continua tão desprotegido e vulnerável como sempre. A reflorestação, o seu reordenamento e manutenção carecem de planeamento e de tempo, muito para além do período de cada legislatura (precisa-se de várias décadas…), sendo que, até ao momento, praticamente não foram (ainda) tomadas medidas eficazes…
Mas que ordenamento para as nossas florestas? De nada parecemos capazes contra o lucro fácil (sobretudo das celuloses) assente na «eucaliptização» do país. É um problema imenso, pois que Portugal já tem, considerada a sua superfície, maior quantidade de eucaliptos do que a Austrália, de onde estas plantas são originárias.
Eu gostava de ver o governo e os ministérios do ambiente e da agricultura a promoverem a sementeira e o plantio de espécies que não pinheiros e eucaliptos (que ardem como pólvora em tempo quente e seco), apoiando quem quisesse proceder à cultura de outras espécies (carvalhos, castanheiros, medronheiros, freixos, olmos, bétulas, cerejeiras…), fornecendo as plantas e alguns subsídios para a reflorestação e para a sua manutenção. Como não existem viveiros em escala, não é fácil, mesmo para quem quisesse, reconverter as suas fracções florestais. Nem sequer para o próprio Estado nas áreas de que é proprietário e de que devia cuidar de modo responsável. E se o Estado não dá o exemplo… Claro que para isto é preciso dinheiro, muito dinheiro, pelo que devia ser solicitado o apoio de instituições supranacionais como a União Europeia. A opção justificava-se (de)mostrando que o apoio não seria simplesmente um favor a Portugal (ou a outras regiões ou países), mas um bem para a humanidade (que precisa de ar puro e de moderar a secura do ar e as temperaturas estivais), colocando a Europa na liderança paradigmática da sustentabilidade ecológica. Do mesmo passo trabalhava-se para o necessário travão (político) à concentração de toda a riqueza económica e financeira em cada vez menos mãos (entenda-se, multinacionais predadoras), redistribuindo-a de maneira mais justa, com base numa sólida educação ambiental promotora e defensora da qualidade de vida dos cidadãos, e acautelando, por outro lado, a paz social. E criava-se riqueza ambiental, de valor incalculável e não convertível em dinheiro (não há dinheiro que a valha ou que a pague), em favor dos presentes e como herança indispensável e obrigatória a legar aos vindouros.
Assunto mal resolvido em Portugal é o da acção da «protecção civil» e, especificamente, do papel dos bombeiros. É generalizada e justificada a simpatia pelos generosos e esforçados operacionais no terreno, mas choca(-me) que se descure a prevenção face ao combate aos incêndios. Ora, os corpos de bombeiros, voluntários ou não, deviam realizar acções preventivas, efectivas durante três quartos do ano, nem que fosse a identificar e referenciar as zonas de maior perigo e a usar o próprio fogo nas estações húmidas, e não apenas a ocupar-se do (perigoso e pouco eficaz) combate às (grandes) deflagrações nos meses de canícula. Carece-se de outra visão dos problemas e de formação para aqueles homens, mas isso requer, eventualmente, outras chefias: repare-se nas guerras inqualificáveis do pontapé na bola em que anda envolvido o presidente da «liga dos bombeiros portugueses», numa altura em que as suas atenções e energias deviam estar focadas na defesa das pessoas, das casas e das florestas.
E porque é que não é assim?
José Batista d’Ascenção