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A matéria orgânica é o pasto de uma infinidade de seres microscópicos que, ao alimentarem-se dela, a convertem, por último, em matéria mineral. Os processos de decomposição são fundamentais no funcionamento da Natureza, eliminando, para além de quaisquer porções orgânicas do corpo dos seres vivos (em que se incluem os detritos alimentares), os excrementos e os cadáveres.
Os animais e, entre eles, os seres humanos são macroconsumidores de matéria orgânica. Não a consumindo fresca ou sob formas menos susceptíveis à acção dos decompositores (como alguns frutos secos, sementes, tubérculos e outros), carece a mesma de ser mantida em condições que a preservem da contaminação e da actividade daqueles microrganismos.
Uma das mais eficazes formas de conservação é usando o frio. Por refrigeração, os catalisadores biológicos (enzimas) diminuem a sua actividade. Quando a temperatura atinge valores bastante inferiores a zero graus, nos congeladores, ficam inibidos. Em consequência, o metabolismo microbiano reduz-se significativamente ou anula-se e os alimentos mantêm-se por períodos (mais) dilatados, durante dias, nos frigoríficos, ou meses, quando congelados.
Como a inibição pelas temperaturas baixas ou muito baixas não afecta a integridade das enzimas, logo que a temperatura sobe e se aproxima do intervalo de valores óptimos para a catálise enzimática, o metabolismo degradativo é retomado e os alimentos deterioram-se. É por isso que os alimentos que tenham sofrido descongelação não devem voltar a ser congelados.
Quando os alimentos se degradam, para além do aspecto adulterado, passam a conter resíduos do metabolismo microbiano que alteram o sabor e o cheiro que lhes é característico. E, nalguns casos, ou os micróbios em si são perigosos ou produzem substâncias tóxicas, situações em que a saúde e a vida das pessoas podem ser postas em causa.
A actividade metabólica das células ocorre no seio da água (em solução aquosa). Por essa razão, uma forma de conservar os alimentos é remover-lhes a água que contêm (secá-los ou desidratá-los), por meio de qualquer técnica ou tecnologia. Sem água, os micróbios existentes sobre ou no interior dos alimentos não metabolizam e, por isso, não os degradam. Mas estes micróbios não estão mortos: logo que hidratados retomam a sua fisiologia, que o mesmo é dizer, a sua capacidade degradativa.
A água é um meio em que se dissolvem numerosas substâncias (é um bom solvente), dentro e fora das células vivas. À semelhança de muitas outras partículas com mobilidade (gases, líquidos, e substâncias solubilizadas ou volatizadas), as moléculas de água deslocam-se espontaneamente das regiões onde há maior concentração de substâncias dissolvidas no seu seio (solutos) para as regiões onde essa concentração é menor (movimento de difusão). Dito ao contrário: a água difunde das regiões onde ela própria é mais concentrada para as regiões onde existe em menor concentração. Este movimento também se verifica através das membranas das células. Ao movimento de difusão da água através de (quaisquer) membranas diferencialmente permeáveis chama-se osmose.
Então, quando se salga(va) a carne ou o peixe, aumenta(va)-se a concentração de solutos no exterior das células, o que leva(va) ao movimento da água, por osmose, do meio intracelular para o exterior. Isto acontece tanto nas células constitutivas dos alimentos, ainda que mortas, como nas células dos micróbios que esses alimentos contêm. Então, esses micróbios fica(va)m impedidos de metabolizar, logo não degrada(va)m os alimentos salgados. A conservação de compotas assenta no mesmo princípio: ao adicionar grandes quantidades de açúcar (soluto) ao meio extracelular dos micróbios, que sempre contaminam a matéria alimentar, aqueles perdem água por osmose, o que retarda o seu metabolismo, limitando, por essa via, a sua capacidade degradativa.
Tradicionalmente havia outros meios de conservação que interferiam com a actividade dos micróbios. Era o caso da fumagem. Nesse processo, para além da secagem dos produtos do fumeiro, a sua impregnação com certas substâncias resultantes da queima da madeira tinha um efeito inibidor da bioquímica dos micróbios contaminantes. Claro está que algumas dessas substâncias não eram saudáveis para os consumidores, o que aconselhava que os alimentos fumados fossem bem lavados antes de cozinhados, como habitualmente se fazia, e que não fossem excessivamente frequentes na dieta, como acontecia normalmente.
Outro procedimento bastante limitador dos micróbios era a imersão em ácido, por exemplo o vinagre (ácido acético), como no caso dos «picles». A acidez (abaixamento de pH) desnatura os catalisadores biológicos, limitando ou impedindo as reações metabólicas dos microrganismos.
Modernamente, optimizaram-se outros modos de evitar a contaminação por micróbios, desde o calor (por exemplo a pasteurização) à irradiação ou à secagem extrema (liofilização) ou à conservação dos alimentos em embalagens esterilizadas e sujeitas a vácuo.
Como nota final registe-se que os alimentos também contém enzimas, as quais promovem reacções que os alteram. A limitação destas reacções decorre em simultâneo e pelos processos de controlo da atividade enzimática microbiana, como referido acima.
Diga-se ainda que nem só os micróbios degradam os alimentos: é o caso da exposição ao ar e da consequente oxidação de alguns dos seus nutrientes: uma maçã cortada diminui drasticamente o seu conteúdo em vitamina C (ácido ascórbico), por oxidação. O mesmo processo torna-a escura devido à combinação dos compostos fenólicos naturais com o oxigénio do ar.
José Batista d’Ascenção
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