Manada de búfalos, Syncerus
caffer subsp. caffer,
a passar
pelo local onde estávamos a colher plantas.
Moçambique, Sofala, 1964
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Comecei a estudar e a colher plantas em 1956, pois tinha de apresentar um herbário no ano seguinte para ter aprovação numa disciplina da licenciatura em Biologia. Nessa altura, levei com um cajado nas pernas, atirado pelo dono de um laranjal, que não acreditou que eu andava a colher ervas e não a furtar laranjas (1).
A expedição mais prolongada que integrei, sempre acampado nas florestas e savanas tropicais, foi a Moçambique e um pouco no Malawi e Zimbabwe, desde o início de novembro de 1963 a 30 de abril de 1964. Essa expedição foi fértil em episódios.
Lembro-me que, estando nós a colher plantas numa floresta aberta, que os ingleses designam por "savana woodlands", começamos a ouvir um barulho enorme, como se fosse uma trovoada a aproximar-se. Ao olharmos na direção de onde vinha o som, vimos uma nuvem de poeira. Então alguém gritou para que subíssemos imediatamente para as árvores, pois era uma manada de búfalos em debandada e, quando a manada vem nessas ondas em trote acelerado, leva tudo à frente.
Foi a nossa sorte. Quando descemos, o solo parecia ter sido lavrado. Ainda consegui tirar uma foto (tremida) do cimo da árvore para onde tinha subido. Ainda me lembro da espécie da árvore, uma acácia de tronco amarelo (Acacia xanthophloea Benth.), a que os ingleses chamam “fever tree”, por causa da febre amarela, ainda frequente nos trópicos nessa época. Amarelo estava eu em cima da árvore!!!
Angola, Serra de Pingano (Uíge). Cascata do rio Luege. António, Luís Ceríaco e J. Paiva 26.XI.2019 |
Cerca de seis décadas depois de ter iniciado a minha carreira profissional, com 86 anos, juntamente com três jovens zoólogos (Gregorius Jongsma, americano; Luís Ceríaco, português e Stwart Nielsen, canadiano, integrei em 2019 outra “Viagem Philosophica” às florestas tropicais de chuva (pluvisilva) do Norte de Angola (província do Uíge).
As expedições científicas nestas florestas devem ser feitas na época das chuvas, quando as plantas florescem e quando os animais que os colegas herpetólogos (o português estuda répteis e o colega estrangeiro anfíbios) estudam se encontram em plena atividade.
Angola. Serra de Pingano (Uíge). Acampamento. J. Paiva e G. Jongsma preparando material. 27.XI.2019 |
Numa das noites em que nos infiltramos na floresta para colher relas e rãs, apanhamos uma enorme trovoada tropical. Chegados ao acampamento, completamente encharcados, encontrámos o interior das barracas completamente alagado. Eu ainda consegui dormir na minha barraca, pois prevenido levara dois sacos cama impermeáveis e, colocando um sobre o outro, pude estar deitado no superior, sem ficar ensopado em água. Já o Luís Ceríaco teve de dormir sentado num dos jeeps! (2)
Jorge Paiva
(1) Foi num Sábado em que andava a colher plantas, acompanhado pelo meu irmão Fernando (um garoto no início do Liceu) e mais dois amigos dele, nos laranjais que existiam na margem direita do Mondego, a montante do Parque da Cidade. A dada altura, um homem, com um cajado, interpela-me dizendo que andávamos a furtar laranjas. Claro que ripostei que não, pois andava era a apanhar plantas (que lhe mostrei) para estudar. O homem não acreditou e furioso por julgar que eu estava a mentir, tentou agredir-me com o cajado que trazia. Fugi a correr, mas ainda levei com o cajado que ele me atirou às pernas, para eu cair. Alcancei os três garotos que se tinham afastado para longe, logo que o homem começou a interpelar-me. Quando já estávamos fora do laranjal, os três marotos começaram a tirar laranjas dos bolsos para as saborearem. Percebi, então, que o homem tinha razão, mas eu é que não sabia que eles tinham feito a malandrice que, seguramente, o homem tinha presenciado.
(2) Texto publicado no «sítio» da Universidade de Coimbra, a propósito da «Semana dos Museus», que está a decorrer.
Afixado por: José Batista d'Ascenção
Afixado por: José Batista d'Ascenção