domingo, 27 de outubro de 2019

Mimos do Outono

Fonte da imagem: aqui.
Passa Outubro e os dias ficam curtos, sombrios e frios. A mudança para a hora de Inverno come o fim da tarde e introduz a noite demasiado cedo. Há vantagens em ser assim, mas custa.
Porém, nem tudo é mau no Outono, e há mesmo coisas muito gostosas. A placidez das tardes soalheiras do fim de Setembro e de Outubro é(-me) muito agradável. A variedade de cores da folhagem das árvores caducifólias pode ser imensamente bela, particularmente o amarelo vivo das Ginkgo biloba, os amarelos e vermelhos variegados dos liquidâmbares ou o vermelho de alguns carvalhos. E, em tempos, apreciava bastante o cheiro a terra molhada, aquando das primeiras chuvas sobre a terra ressequida. Quando o frio chega, umas castanhas assadas, à tarde ou ao serão, à volta da mesa, no quentinho da cozinha, sabem maravilhosamente, sobretudo na companhia de amigos com quem é agradável falar, sem necessidade de fazê-lo artificialmente.
É também um tempo propício à reflexão é à recordação de outros tempos, vivências e amizades. Talvez um tempo de pensar e de escrever. Ou de ler. Ou de tudo isso, como, afinal, são todos os tempos.
Além do mais, se não houvesse Outono e Inverno, não apreciaríamos tão bem a Primavera e o Verão.
Contentemo-nos.

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 22 de outubro de 2019

Gastos estratosféricos relacionados com o «pontapé na bola»!

Imagem da Wikipédia
Hoje, alguns meios de comunicação, como é o caso do jornal «Correio do Minho», noticiam «contas» relativas aos custos do estádio de Braga.
Afinal, esses custos são, pelos valores agora trazidos a lume, mais de três vezes superiores. Concretamente, as despesas com juros foram, em 2018, de cerca de 25 milhões de euros. Ora, isso dá, por mês, uma cifra superior a dois milhões de euros, o mesmo é dizer que são pagos mais de sessenta e oito mil euros diários, ou que se pagam mais de 2.800 euros por hora!
No Correio do Minho, refere-se que «o presidente da Câmara aponta que o estádio custou mais do que o Hospital Central» (página 5); e foi feito anos depois, pode-se acrescentar.
Aparentemente, estes factos não escandalizam a maioria dos bracarenses.
Não é o meu caso.
Solitariamente, mas com determinação, associo-me à voz do vereador da CDU: Quem assume a responsabilidade ou é responsabilizado por tamanho descontrolo?

José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Em setenta anos, como a língua evoluiu, «conho»!

Fonte da imagem - aqui.
Porque me dá para revisitações do tempo dos meus pais e avós, já longínquos (e na maioria ausentes) da memória dos (mais) jovens, li o livro «A Noite e a Madrugada», de Fernando Namora, recentemente posto à venda com o jornal «Público», em edição fac-símile do original de 1950.
Embora com a acção restrita à raia fronteiriça das Beiras, onde o vocabulário da zona, por força do isolamento (físico, geográfico, social e cultural) fez seus certos termos e expressões, fiquei impressionado com a quantidade de palavras que se despediram do léxico, por falta de uso, excepto pelos anciãos ainda lá residentes, esquecidos do mundo, e pela desertificação (humana) do território.
O contrabando era a fuga perigosa (já que os guardas não hesitavam em dar uso à «matrafusca») ao amanho da terra, «surribada» e «alqueivada» como necessário, à actividade (que podia ser «prantar arbes») nas «courelas» e à pastorícia (em que pastores e gado se recolhiam nas «malhadas»), cada qual no fito de «adregar» conseguir alívio da fome e da miséria. Alívio que não era suficiente, mesmo quando havia «poia» do forno e «fanega» de semeadura, se não se restringisse a ervas e frutos silvestres, como a «marouva». A violência era permanente e (por isso) banal, nas famílias e no convívio, no trabalho, nas ruas ou nas «bodegas», pontenciada pelas «canadas de vinho». E o crime também, não só o dos deserdados da fortuna, como, e mais doloso ainda, o dos poderosos sobre eles… Nalgumas cabanas, as portas fechavam à «tramela» e as condições não seriam muito diferentes das das «furdas» dos «cevados».
A caracterização física e psicológica das personagens retrata bem a condição humana e o ambiente social e político da altura, naquele meio específico (não tão diferente assim do do resto do país), pelo que a obra, além do valor literário, e do conteúdo ficcional, tem também interesse documental de um tempo, de um lugar e de uma linguagem.
O remate final faz-se com o velório do cadáver de um campónio, já velho e limitado (“que às vezes segurava a «quebradura» inchada do esforço”), mas de temperamento feroz («endemonhado») que, «espichado» no catre, vestido e calçado como nunca em vida (desde o dia do casamento), é alvo de hábeis artimanhas de um dos filhos, que o odeia (porque o pai o maltratou desde «rapazelho»), para lhe roubar as botas lustrosas de «calfe», antes de o colocarem no «esquife». O que consegue, iludindo os presentes com mestria, evitando que tão bom par de calçado fosse apodrecer com o corpo, de mais a mais andando ele descalço.
Com muitas outras palavras e expressões habituais naquele tempo e hoje sem uso, nem sequer «de ralo em ralo», a leitura do livro não é prejudicada por esse facto. E vale a pena. 

José Batista d’Ascenção

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Concerto(s) Nova Arcada Braga Blues

(brevíssima nota)

Sobre o de ontem à noite: Em palco uma combinação feliz e prodigiosa: o génio (de criação, improvisação e execução) de Mário Laginha; o virtuosismo, a sensibilidade, a voz e o poder de interacção com o público, de Budda Guedes; a versatilidade primorosa e fantástica de Frankie Chavez; o rigor do baixista Vasco Moura; e a precisão, ora suave, ora intensa e forte, do baterista Nico Guedes. Em todo o espectáculo, a harmonia, a beleza e a arte do conjunto ou dos solos e diálogos entre grandes talentos.
A assistência, arrebatada, teve, em acréscimo, o prémio da chamada ao palco da colossal Diunna Greenleaf, cantora (de blues) americana que emocionara os (muitos) que a ouviram no (extraordinário) concerto da noite anterior, no mesmo espaço. E ela, cantando, puxou do fundo do peito (sobre o lado esquerdo, seguramente), da sua voz melódica e ritmada, profunda e enérgica e grave e doce, as palavras «I don’t forget you. Never. Never. Never. Never.», rematadas, no todo da canção, por um «Obrigado, Braga».
Quem ouviu foi às nuvens e agradeceu.
Com estrondoso aplauso. 

José Batista d’Ascenção

domingo, 6 de outubro de 2019

O privilégio e o gosto de poder votar

Imagem obtida via «Google»
Esta manhã, pelas nove e meia, fui votar. No acto, lembrei-me dos meus pais, que passaram metade das suas vidas sem o poderem fazer, e dos meus avós, que só o puderam fazer em idade avançada. Nos tempos da ditadura, até Abril de 1974, ou não havia eleições ou, quando havia, os elementos da oposição que estavam nas mesas de voto tinham que sair na altura da contagem dos sufrágios. Por isso, com alegria, cumprimentei com aperto de mão todos os elementos da mesa onde depositei o boletim.
E desejei que eles tenham percebido que lhes estou grato pela generosidade de estarem ali. 

José Batista d’Ascenção