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A formação dos indivíduos e a sua preparação em domínios básicos do conhecimento científico alteram para muito melhor a qualidade de vida das sociedades, seja em termos de satisfação pessoal no dia-a-dia, seja em poupança económica, seja na saúde e na prevenção de acidentes, não raro mortais. Por isso reputo de fundamental a aprendizagem escolar, entendida no sentido (mais clássico) da aquisição de conhecimentos teóricos e da sua (conveniente e necessária) aplicabilidade prática concreta.
Lembro-me do cuidado de um colega estudante universitário, já quase licenciado em matemática, para que tinha uma inclinação notória e um gosto especial, que conheci quando fui morar para uma residência de estudantes, ao tempo em que também eu andava na universidade, sempre que o frio o obrigava a ligar à tomada eléctrica um irradiador de resistências: o seu medo era que o aparelho ligado lhe consumisse o oxigénio do quarto, motivo por que abria a porta ou uma fresta da janela. Espantado, disfarcei como pude e tentei explicar-lhe que o calor proveniente das resistências ao rubro não correspondia a uma combustão e que, por isso, era infundado o seu receio. Não me adiantei no esclarecimento do que é uma combustão e da propriedade comburente do oxigénio. E pareceu-me que não o convenci…
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De outra colega com quem partilhei a cozinha de uma casa, quando ambos iniciávamos a vida de professores, recordo a sua preocupação de que a panela ao lume do fogão (a gás) fervesse sempre a bom ferver, para o que mantinha a boca no máximo, o que exigia que estivesse sempre alerta para que a água em alta ebulição não saltasse da panela e apagasse a própria chama. Um dia tentei dizer-lhe que, estando o cozido em franca fervura, fenómeno que ocorria a uma dada temperatura, não valia a pena gastar mais gás, com a boca no máximo, porquanto aumentava o consumo, sem aumentar a temperatura de cozedura, e aumentava também o (meu) trabalho a arrumar a cozinha no final (erro meu, porque, nabo em culinária, já nessa altura me remetia às tarefas de limpeza e arrumo após as refeições, condição que não contribuía para valorizar o meu «estatuto» e, por consequência, a minha opinião…).
A algumas pessoas de família procurei (com diplomacia…) convencer de que o zelo em lavarem a boca e escovarem os dentes antes de tomar o pequeno-almoço, não o fazendo a seguir, era um trabalho incompleto e mal feito, tal como se lavássemos as mãos antes de ir à casa de banho e não depois. Se «sujamos» os dentes ao comer é imediatamente depois disso que os devemos lavar, para que não fiquem «sujos» e para evitar que a fermentação dos restos produza ácidos que os vão corroer. E aqui tive sucesso. Também os meus filhos entenderam, aceitaram e praticaram isso desde sempre, com a mesma receptividade e concordância que sinto nos alunos quando tenho oportunidade de lhes falar nisso.
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Um fenómeno que me impressiona, especialmente quando vem de pessoas cultas com formação universitária é a convicção de que, tendo bebido às refeições, é possível escapar à eficácia dos balões das polícias na estrada. Com uma crença inabalável, referem mais do que um modo de escapar à detecção, por exemplo mediante a prévia ingestão de café sem açúcar, que «corta o álcool», dizem! Acabrunhado, discordo com suavidade, referindo, quando me é dada a oportunidade, que o álcool absorvido para a corrente sanguínea é eliminado fundamentalmente por metabolização no fígado, que é a via principal (90%), e pela contínua evaporação nos pulmões (motivo por que as pessoas embriagadas cheiram a etanol) e alguma excreção renal e pelo suor, donde não haver maneira de iludir a sua presença no organismo… Mas é desconfortável desdizer as “certezas” das pessoas, tanto quanto é gratificante a receptividade com que os alunos recebem esclarecimentos deste tipo.
E há mesmo situações que, de tão comumente esclarecidas, como em tempos foi feito com certos anúncios publicitários de prevenção em organismos públicos de comunicação social, espanta que continuem a verificar-se: é o caso daqueles que, tomando bebidas como o uísque, estão convencidos ou insistem em convencer-se de que, se lhe juntarem uma água mineral ou várias pedras de gelo, diluem o álcool e por isso lhes faz menos mal. Ora, como o álcool é muito eficazmente absorvido no intestino, todo ele passa para o sangue, quer tenha sido bebido mais concentrado ou mais diluído…
E há muitos, muitos casos parecidos, como a ideia de que um café «comprido» tem menos cafeína, ou que um acrescento de água na panela da sopa faz diminuir o sal em excesso que se lhe juntou, etc.
Infelizmente, erros como estes e outros, repetidos ao longo de vidas têm consequências severas na saúde, na carteira das pessoas, na economia do país e, tantas vezes, na própria vida. A prevenção de acidentes em casa ou nas estradas, e dos incêndios (na floresta, em espaços abertos como aconteceu num festival de Verão no início de Agosto de 2016, em edifícios onde funcionam associações, etc.) ou o cumprimento de certas normas de higiene pública e de ecologia, também passam por aqui, porque diminuem a ignorância e a inconsciência, vulgo irresponsabilidade, das pessoas, melhorando a percepção do perigo e do risco inerentes a certos actos e procedimentos.
Por isso, o papel da escola é tão importante, sendo erro indesculpável desvalorizá-la ou prejudicar a sua função.
José Batista d’Ascenção