Com esta série de textos homenageio humildemente Charles Darwin que, no seu tempo, ao que parece, não teve ninguém que o lesse em Portugal continental.
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Prevenidos mediante a chamada «consulta do viajante», que havíamos feito atempadamente, tomámos todo o cuidado com a água para beber, evitámos os sumos naturais refrescados com blocos de gelo, sempre servidos à refeição (almoço e jantar), e deixámos de lado as saladas de vegetais crus, que sempre acompanhavam o segundo prato. Isto foi nos primeiros dias. Por vermos outros fazê-lo descontraidamente, sorrindo-nos, experimentámos cautelosamente, um de cada vez, os sumos e, mais tarde, as saladas. Limitámo-nos ao cuidado rigoroso com a água e não houve qualquer problema com nenhum dos três. Curiosamente, na viagem de regresso, a comida do avião não caiu propriamente bem em dois de nós.
As pessoas nativas com quem contactámos, funcionárias dos hotéis, taxistas, empregadas/empregados de restaurantes e lojistas, para além de pessoas na rua, têm feições marcadas, com tez morena e cabelo preto, e sorrisos meigos que mostram uma dentição branca e sem falhas. Não vimos pessoas de grande estatura física nem demasiado gordas. Admito que estes traços morfológicos resultem de factores genéticos, da alimentação (muito rica em vegetais) e das condições do clima. Todas as pessoas com quem falámos nos trataram com simpatia. E, nos poucos casos em que adiantámos uma pequena gorjeta (que a maior parte espera e agradece), abriam-se sorrisos de franco contentamento. Sendo mais difícil do que parece a comunicação em espanhol (que nós supomos que entendemos facilmente e não é bem assim…), e porque nos perguntaram mais que uma vez se éramos brasileiros, verificámos que ninguém sabia da existência de Portugal. Para facilitar a compreensão experimentei referir o nome de Cristiano Ronaldo e aí, sim, eles conheciam. Num caso expliquei que Portugal era um país «colado» à Espanha, muito antigo, com quase novecentos anos, e que colonizara o Brasil, ao tempo em que a Espanha fez outro tanto no resto da América do Sul e Central.
O Equador é um país pobre. Nas diferentes ilhas, as habitações têm, de comum, o primeiro piso, com a primeira placa a servir de tecto e é assim que são habitadas. Sobre a placa, apontados ao céu, com a extremidade superior prolongando-se pelas vergas de ferro, expostas, erguem-se verticalmente pilares de cimento para, ao que nos foi dito, quando as pessoas tiverem dinheiro, acrescentarem novos pisos. Isto cria (aos nossos olhos) uma impressão esquisita de casas inacabadas ou em obras permanentes, com prejuízo da harmonia estética.
Ficou-nos a impressão de que todas as pessoas das ilhas têm uma relação muito pacífica com os animais, pela atitude serena com que convivem uns com os outros. Por maioria de razão isso acontece com todos os que trabalham no Centro de Investigação Charles Darwin, em Puerto Ayora, em Santa Cruz, ou no Centro de Interpretação em Baquerizo Moreno (a capital do arquipélago das Galápagos, cidade com menos de 7.000 habitantes), na ilha de S. Cristóvão, e com os que servem no Parque Nacional das Galápagos, com quem aquelas instituições colaboram. Nessas instituições, como o Centro Charles Darwin, trabalham pessoas de países estrangeiros, parte delas, pelo menos, em regime de voluntariado. Era o caso de uma jovem bióloga marinha inglesa, que fazia saber, discretamente, que o dinheiro que se cobra aos turistas, antes de embarcar no avião, em Quito, e à chegada, em Baltra, assim como a taxa de entrada em algumas ilhas (dez dólares por pessoa para desembarcar em Isabela), não chega ao Centro de Investigação de Darwin. Numa criação de tartarugas na ilha Isabela, uma jovem que lhes limpava o espaço e fornecia alimento, era asiática…
O controlo de passageiros e bagagens nos ancoradouros de chegada/partida de cada ilha era muito rigoroso, mas feita por profissionais correctos e eficientes. Os que servem nas embarcações revelam igual eficiência. Para se viajar por conta própria entre cada ilha, um barquinho pequeno com 10-12 pessoas leva os passageiros e as bagagens desde a plataforma de saída até uma lancha maior, que pode levar 20-25 pessoas, e que espera a cento e cinquenta ou duzentos metros do ancoradouro. Quando se chega a outra ilha, pessoas e volumes são transferidos, a uma distância semelhante, para os barcos pequenos que os conduzem à plataforma de chegada do ancoradouro, onde se faz o desembarque. Saltámos de ilha em ilha, cada um com uma mochila e a sua «maleta» e, não obstante tanto tombo das malas (que resistiram bem, apesar de maltratadas), tudo correu bem.
Nas ilhas, nas cidades ou nos circuitos visitáveis, circulámos a pé ou chamávamos táxis. Em Puerto Ayora, qualquer percurso na cidade ficava por um dólar e meio; em Puerto Villamil (Isabela) cada percurso na cidade ficava a um dólar por passageiro. Os taxistas forneciam informações suficientes para nos orientarmos. Nos centros de criação de tartarugas, de interpretação ou de investigação, havia informação escrita clara e bastante.
Com base no trabalho que realizou em grande parte nas ilhas Galápagos, cerca de 24 anos antes, Charles Darwin publicou em 1859 o livro: «On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life», que mudaria para sempre as ideias sobre a origem e evolução das espécies, incluindo a humana. Que o trabalho que se faz actualmente no arquipélago seja fonte de saber e exemplo inspirador para que o ser humano não apresse o seu fim sobre este belo planeta azul que nos cabe habitar e deixar aos vindouros.
FIM
José Batista d’Ascenção