Terminou a «correcção» dos exames nacionais de biologia e geologia. Se os resultados globais forem parecidos com os da meia centena de provas que me calhou, mais uma vez ficaremos longe do desejável. Acontece que quem ler a prova provavelmente não a acha mal elaborada, nem desconforme com os programas, especialmente se comparada com as de anos anteriores. Onde procurar então as explicações do insucesso de tantos alunos? Os factores são vários e convinha identificar os principais:
- O programa de biologia de décimo ano, cujas rubricas, cada uma por si, têm interesse, carece de actualização, de articulação, de sequenciação e de adequação aos alunos a quem se destina. A indicação de «aprendizagens essenciais» limitou-o, e bem, mas não resolveu o seu carácter vago e superficial. Este programa precisava de ter sido revisto, tornando-o uma sequência lógica de conteúdos, onde, por exemplo, faria todo o sentido dar relevância aos catalisadores biológicos, que os alunos do ensino secundário não estudam, a não ser no 12º ano, caso optem pela disciplina de biologia. Se pensarmos em requisitos fundamentais para a frequência de cursos superiores de biologia, de saúde, de veterinária ou de bioquímica, parece impossível…;
- Os professores precisam de formação e actualização científica específica e de serem libertados de toda a (horrenda) burocracia não lectiva, a fim de se poderem dedicar (mais e melhor) ao ensino e acompanhamento dos alunos. O sistema de formação contínua das últimas décadas, mais virado para as exigências formais da progressão (ainda por cima congelada durante anos), em matéria de biologia, foi muito ineficaz. Diga-se que a formação inicial dos professores, implicando naturalmente a necessidade de actualização permanente, cumpriu os requisitos no domínio científico, mas iludiu os docentes no campo pedagógico. A substância da pedagogia, enquanto ciência (para além da arte que não deixa de ser), escapou à formatação infundada a que sujeitaram «levas» seguidas de professores, de que eles ficaram prisioneiros e ruinosamente expostos à mutabilidade psico-social de sucessivos universos de alunos. Todos na escola vivem e sentem isto, e muitos o afirmam, mas ninguém assume responsabilidades…;
- A feitura das provas de exame foi melhor nesta 1ª fase do que na maior parte dos anos anteriores, desde 2006. Porém, mesmo com questões bem redigidas e enquadradas com os programas, precisamos de saber se esta «arquitectura» e modo de elaboração das provas: a composição dos textos, a maneira de construir as opções, o «desenho» das sequências… e o preciosismo de certas exigências dos critérios (ver exemplos específicos em «post» seguinte) não prejudica alunos que até sabem alguma coisa das matérias, mas que por motivos neuropsicofisiológicos ou outros se afastam das respostas exigidas. Nestes domínios é que os especialistas das respectivas áreas podiam fornecer pistas úteis. Afinal o que queremos testar: se os alunos sabem ou se são proficientes a descodificar certos «estilos» de interrogação? Atenção, não se pretende insinuar a obtusidade crassa dos enunciados das provas nem se sugere condescendência para a incapacidade de escrita de muitos alunos.
No quadro dos resultados que temos vindo a obter, resta ainda uma hipótese adicional – a de os professores de biologia e geologia serem genericamente medíocres e incompetentes. Se assim fosse, não poderíamos deixar de perguntar quem e como os formou, quem os seleccionou para ingressarem no ensino e quem inspecciona a sua acção. Ainda assim, a ser verdade – e não creio que seja – melhor opção seria dar-lhes condições para poderem ensinar e demiti-los caso o não fizessem aceitavelmente. Perante tantos casos de insucesso, inadmissível é «obrigá-los» a mistificar as classificações: que os filhos dos (mais) pobres não ganham nada com um ensino que até pode diplomá-los, mas que os não prepara. E os restantes também não. Nem a sociedade. Nem o país.
José Batista d’Ascenção
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