Se o assunto fosse para graças, diria que também joguei à bola, que nunca perdi por mais de dez e que era frequentemente um elemento desequilibrador, especialmente em desfavor da minha equipa.
Mas o caso é sério. Afinal o que valem os (chamados) «direitos humanos»? E porque é que o futebol é um mundo à parte na justiça e nos negócios?
Bem sei: as pessoas, na sua maior parte, são apaixonadas pela modalidade, entendem-na facilmente, identificam-se com os seus protagonistas e vivem-na de modo intenso, até para esquecerem as agruras da vida e se evadirem do castigo que é sofrer as medidas governativas dos políticos e a violência da subjugação imposta pelos donos do dinheiro.
Já os poderosos e os políticos tiram os benefícios que podem da alienação futebolística: os primeiros através de negócios muitas vezes opacos e os segundos mediante o adormecimento dos eleitores.
Os jogadores de eleição, esses, em número restrito relativamente à globalidade dos praticantes, auferem quantias estratosféricas, muitas vezes fugindo ao pagamento de impostos.
Que importa que o dinheiro envolvido seja de proveniência duvidosa e que finte as regras das finanças? Pior, qual é o problema de entregar a organização de campeonatos mundiais a países corruptos e sem o menor vestígio de respeito pelo que deviam ser direitos inalienáveis dos cidadãos, especialmente das mulheres e das pessoas desconsideradas por preconceitos sociais? Não importa nada. Não há problema nenhum.
Antes pelo contrário: falam-nos de patriotismo, de apoio aos nossos atletas, da importância de projectar o nome de Portugal no mundo.
É diverso o meu conceito de patriotismo. E gostava que o nome do meu país se tornasse relevante por outros motivos, como seja o da exigência de um módico de ética e de respeito por quaisquer pessoas.
Daí que não entenda nem aceite que vão a correr para o "Catar" (que raio de nome!) o presidente da república, o presidente da assembleia da república e o primeiro-ministro.
Mesmo que Portugal ganhe a competição, o ganho será à custa de valores maiores que esquecemos. E, ganhe quem ganhar, será uma legitimação do país anfitrião em que vigora um regime político execrável, com a colaboração de todos os que participam.
O que retirará dignidade ao vencedor, brilhante e merecedor que seja, quer se queira quer não.
Pertenço ao grupo dos que não rejubilarão, na hipótese de não ser o único.
José Batista d’Ascenção
Adenda: Uma palavra de apreço aos corajosos, futebolistas ou jornalistas, que, no "palco", têm assumido posições de crítica e de defesa dos direitos humanos. Muito merecidamente.
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