Sento-me à janela, na casa em que nasci, e demoro a vista nos contornos da serra que todos os dias olhei quando menino. Conheço-lhe o perfil quartzítico, de antes do espreitar do sol, que nasce entre os seus cumes, até ao findar do dia, à luz esmaecida do poente. É como se aquela montanha me conhecesse ou eu a sinto como se fizesse parte dela. A sua rudeza maciça e os gumes dos seus rochedos – “canchos”, no dizer dos antigos - resistentes à erosão, são de uma nobreza humilde e sólida, que nem precisava do monumento de Siza Vieira que lá se constrói agora.
Os rasgões na paisagem, em vertentes mais próximas, são recentes. Destinar-se-iam a um daqueles projectos megalómanos sem futuro nem respeito pela orografia e pela Natureza. As chuvas de sucessivos Invernos podem demonstrá-lo da pior forma, mas, se acontecer, ninguém será responsável… Dizem-me que já foi embargado. Eu pergunto-me como é que deixaram que acontecesse.
Escassas semanas depois dos incêndios de 2020, os eucaliptos vingaram-se, iniciando uma explosão de milhões de sementes que germina(ra)m em todos os espaços disponíveis. Uma asfixia, que não se vislumbrava (ainda) há quarenta anos. E que a violência das chamas ceifará, quem sabe se antes de estas árvores darem o primeiro corte, fonte de rendimento com que os residentes, apesar de envelhecidos e desesperançados, contam. É um fado. Uma “sina”, que até eu consigo prognosticar, desejando, porém, que a realidade (me) desminta.
Ocorrem-me pensamentos difusos quando, solitário, fico imerso nestas terras a que pertenço e que sempre transportei comigo, silenciosamente.
Aquém ou além do Moradal, esteja onde estiver, ou ande por onde andar, as minhas raízes são (d)aqui.
José Batista d’Ascenção
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