Terminei o livro «Por amor à língua e à literatura», de Manuel Monteiro.
Nem eu sabia quantos erros cometo no uso da riquíssima e belíssima língua que é a nossa.
O autor é de um rigor extraordinário, detecta incorrecções da escrita e elucida as falhas com clareza, elegância, humor e beleza. Aprende-se muito.
O capítulo mais extenso é sobre o Acordo Ortográfico [AO]. É verdade que o AO «deixou a língua portuguesa em cacos», tem contribuído para alterações da pronúncia (vê-se e ouve-se nas notícias) e «é uma máquina de fomentar erros» (basta ler o Diário da República).
Dicionários, prontuários, em papel ou digitais, e suportes informáticos como a Infopédia, o Ciberdúvidas ou o Portal da Língua Portuguesa não se entendem entre si nem em si mesmos sobre a ortografia de muitas palavras (que mudam frequentemente). Como aceitar o registo formal de «interrutor» ou «suntuoso»? Ou que as regras de hifenização sejam um caos, em que, frequentemente, apesar de seguirem o AO, os instrumentos da língua se contradizem uns aos outros e infringem as normas do dito? Fica tristemente claro que a sujeição da escrita à pronúncia é «uma aberração linguística», quer porque ninguém sabe o que é a «pronúncia culta», quer porque a pronúncia é variável de região para região, até num país pequeno, como Portugal.
O objectivo de uniformização da língua na comunidade de países de língua portuguesa é um embuste. E, neste campo, o AO foca-se apenas em Portugal e no Brasil, o que é desrespeitoso para os restantes. Segundo a investigação de «Maria Regina Rocha, havia 2691 palavras que se escreviam de modo diferente e que se mantêm diferentes, 569 palavras diferentes que se tornam iguais e 1235 palavras iguais que se tornam diferentes.» Ou seja: o AO teve um efeito contrário ao seu propósito.
O AO é «uma obra de mutilação das raízes latinas, da etimologia e da lógica da língua», diz o autor, e eu não duvido. E o problema maior é que o AO não é susceptível de qualquer «polimento possível que retoque o que não tem ponta por onde se lhe pegue.», refere também.
Donde, lamento os políticos que temos e decepciona-me a adesão conformista dos professores de Português do meu país a uma matéria que está longe de lhes facilitar a tarefa.
José Batista d’Ascenção
Brilhante como sempre! Completamente de acordo.
ResponderEliminarUm abraço grande e amigo
Carlos
Obrigado, Carlos. Um grande abraço.
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