Fonte da imagem: aqui [adaptada] |
Depois de tantos dias, vencidos os receios e tomadas algumas cautelas, volto a sentar-me à mesa do café, na esplanada (onde não era comum ficar, porque o interior era mais convidativo à leitura do jornal ou ao registo de algumas notas, se sozinho, ou à conversa, quando acompanhado).
E sente-se, de novo, o agrado de sempre. A máscara fica no saco, pega-se na caneta e alinham-se (estas) duas ou três palavas, enquanto chega companhia. É bom. Naturalmente, persiste a dúvida: quando é que podemos voltar ao convívio despreocupado de há três meses? Não est(ar)á próximo esse dia, mas ansiamos por ele mais ainda do que se tivera data marcada.
Entretanto, apela-se à retoma do “consumo”. Para animar a economia, dizem uns. Para se “voltar a viver” dizem outros. Em acontecimentos “culturais” ocorrem ajuntamentos. Em manifestações ética, social e politicamente compreensíveis esquecem-se regras sanitárias eticamente recomendáveis. Com que consequências vê-lo-emos depois. E nos aviões parece que não há, em Portugal e no mundo, perigo em que se encham, o que não é, obviamente, verdadeiro.
Entrementes, nos bairros pobres de Lisboa e arredores os números da pandemia não são nada animadores. Como encontrar e aplicar medidas eficazes, poucos o sabem.
Em termos gerais, à pandemia vírica seguiu-se a “pandemia do medo”, muito “martelada” pela comunicação social. Os esclarecimentos foram e são frequentemente contraditórios. Os exemplos também. Balançamos entre o receio do contágio e o anseio pelo regresso à “normalidade”. E não temos o problema resolvido. Aliás, agora temos vários problemas: na saúde, na dificuldade de um grande número de pessoas adquirir alimentos e outros bens essenciais, no desemprego, no funcionamento das escolas, na economia, no retorno à abundância de plásticos. E os (mais) pobres, como sempre, são os mais afectados.
Tentar saborear a maré estival e não pensar na “rentrée” do próximo outono não é um exercício fácil para todos. Assim mesmo, importa aproveitar o bem que (por enquanto) temos: mal seria se morrêssemos de medo, incapazes de viver com o entusiasmo possível.
José Batista d’Ascenção
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