domingo, 1 de dezembro de 2024

A importância das boas traduções

Tenho entre mãos um livro de uma boa editora que não estou a gostar de ler. Salvo outros factores, ou é de mim ou é do autor ou é do tradutor, ou de dois de nós ou mesmo dos três.

O que me interessa aqui é a qualidade das traduções.

Oiço dizer que muitos bons poemas de quaisquer línguas são intraduzíveis. Concordo e não concordo. Deixando de lado o que é boa poesia, questão cada vez mais pertinente, conheço casos em que a tradução de um poema ou obra poética é de valia igual à do original. Dou um exemplo inquestionável: a tradução de «A Divina Comédia» de Dante Alighieri por Vasco Graça Moura. Facilmente se aceita que, se Graça Moura tivesse traduzido um bom poema de um autor razoável, essa tradução facilmente suplantaria em qualidade o poema primitivo.

O mesmo vale para a prosa. Não sei por que para tal lhe deu, Eça de Queirós traduziu para português um livro de um autor inglês que intitulou «As minas de Salomão». Refere-se comummente que a obra traduzida vale menos do que a tradução. Conhecendo razoavelmente a obra de Eça, mesmo sem poder fazer a comparação – dado que o meu inglês não chega a sofrível – nada me custa aceitar que assim seja. E, contudo, na tradução desse livro, o nosso prosador maior ignorou um erro objectivo relativo à descrição de um eclipse, que o autor (mais ou menos desconhecido) havia cometido. Séculos antes, Camões, que tinha uma memória prodigiosa e uma cultura profunda e vastíssima, dificilmente cometeria um erro «científico», por assim dizer.

Mas, o caso que me fez despertar para a importância das traduções foi a leitura repetida de «Dom Quixote de la Mancha», uma não sei de quem (desfiz-me dos volumes dessa edição…) e outra posteriormente, de Aquilino Ribeiro Machado. Nessa altura, apercebi-me de trechos saborosíssimos que antes não me tinham impressionado tanto. Duvidoso, fui comparar as duas versões em diferentes passagens, para ver se a diferença estava no sujeito leitor. Não estava, uma vez e outra e outra, a riqueza do conteúdo não tinha comparação. Foi então que a minha admiração pelo autor do «Romance da Raposa» cresceu desmesuradamente.

Quem faz uma boa tradução de um bom livro, realiza uma (nova) obra muito meritória.

José Batista d’Ascenção

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