Em Portugal, a esperança média de vida é hoje das mais altas do mundo (80,3 anos para as mulheres e 77,6 para os homens, valores de 2015, segundo dados da «Pordata»). Porém, enquanto nos países nórdicos, se vive com saúde até muito próximo do fim da vida, entre nós, muitas pessoas com 60 anos ou mais padecem de muitas mazelas físicas e psicológicas, e grande parte dessas pessoas consomem quantidades às vezes impressionantes de medicamentos diversos para várias doenças. Isto significa que, no nosso país, a terceira (60?-80 anos) e a quarta idades (a partir dos 80 anos) são um tormento progressivo para uma elevada fracção das pessoas dessas faixas etárias. Em suma: não se envelhece bem em Portugal.
A agravar o problema, em termos sócio-económicos, está a taxa de natalidade (número de nascimentos…), que é uma das mais baixas do mundo. Diminuindo o número de crianças e jovens e aumentando o tempo médio de vida aumenta exageradamente a proporção de pessoas envelhecidas. Por sua vez, entre os adultos, devido à crise internacional que abalou países como Portugal nos últimos seis anos, muitos dos nossos jovens qualificados e pessoas que perderam o emprego fugiram para o estrangeiro. Naturalmente, a maior parte das pessoas que deixaram de trabalhar permaneceu no país, umas simplesmente desempregadas, outras tendo sido indemnizadas para deixarem o trabalho e as outras na condição de aposentadas por idade ou invalidez. Resultou de tudo isto o agravamento da desproporção entre o número de pessoas que trabalham e as que deixaram de o fazer, com consequências muito negativas para a economia do país e, sobretudo, para a vida quotidiana das pessoas.
Na vida privada e social dos (mais) idosos há sempre situações indesejáveis de miséria, de solidão, de abandono, de doença ou de maus tratos, mas o mais comum talvez seja a fraca solicitação por parte da sociedade, na atenção que as pessoas merecem e no desperdício que é não colher os benefícios que daí adviriam: mais compensação afectiva, mais entusiasmo, mais disponibilidade, melhor interacção social, mais saúde e mais alegria…
Saber de pessoas que vivem imersas na solidão, perdem a noção dos dias da semana e do calendário, têm dificuldades na organização horária e ocupacional de cada dia, gastam horas ao telefone ou frente às televisões, tentam sentir-se úteis alimentando impropriamente pombos no espaço urbano, ou se viciam na “generosidade” de alimentar dezenas de gatos em recipientes improvisados que espalham na via pública, e com quem falam o que não falam com seres humanos que os escutem, são tudo formas, entre outras, de deitar fora a riqueza de tantos seres humanos, matando-lhes o gosto de viver e obrigando-os a arrastar-se numa velhice degradante.
Por outro lado, muitas pessoas com sessenta anos ou mais gozam, felizmente, de um estado de saúde físico e anímico que lhes permitiria prestar serviços muito relevantes à comunidade se conseguíssemos um pouco mais de organização e estímulo nesse sentido. Não que estas pessoas não sejam muito úteis: que o digam tantos filhos e netos que têm nos pais/avós um sustentáculo não só para fazer o acompanhamento e cuidado de crianças, como para ajudar em tarefas de casa ou mesmo (ou principalmente…) como apoio financeiro. Mas isso pode ser muito pouco para valorizar e entusiasmar pessoas cheias de capacidade, a quem não é legítimo privar dessa possibilidade.
Nesta altura, aproxima-se do fim a campanha para as eleições autárquicas. Um dia destes dei comigo a pensar que, se a lei permitisse, em paralelo, um regime de voluntariado nas candidaturas às juntas de freguesia, talvez muitas pessoas aposentadas ainda relativamente novas e cheias de frescura pudessem dar o seu contributo generoso de uma forma dedicada e gratuita, poupando o erário público, apenas pelo gosto de fazerem o bem pela comunidade, sem mais receberem por isso que o justo reconhecimento dos seus conterrâneos. Se a experiência vingasse, ainda que numa pequena fracção das 3092 freguesias (ou associações de freguesias) existentes, para além da poupança, minimizavam-se as acções interesseiras e ruidosas de competição agressiva, de todo dispensáveis, e estimulava-se a prática do bom exemplo. Daqui a quatro anos talvez valesse a pena.
E quem sabe se o procedimento não tenderia a ser beneficamente aliciante e contagioso? Mesmo correndo o risco de, daqui por oito anos, com o prolongamento da idade da reforma, já serem raros os aposentados com frescura e disponibilidade…
José Batista d’Ascenção
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