Cores do Outono |
Não vai o tempo como costumava, dizem os de mais idade. Há um ano e três semanas, as temperaturas estavam altas e o tempo seco propiciou uma vaga de incêndios que nos deixou perplexos e (algo) paralisados. Após a tragédia, perdidas muitas vidas humanas e devorados milhares de hectares de floresta, fomos fazendo contas à vida e ansiando por chuva que nos livrasse do inferno dos fogos.
Este ano fomos menos castigados. Houve alguma remoção da biomassa vegetal da proximidade das habitações (havendo ainda muito por fazer neste ponto específico) e das proximidades das vias de trânsito; as pessoas estavam mais alertadas, pelas circunstâncias e pelas chamadas de atenção via telemóvel e em campanhas incisivas na rádio e na televisão; e a mobilização de meios de prevenção e de combate terá sido mais pronta e mais bem sincronizada. Não obstante, o factor porventura mais determinante a proteger-nos este ano (peço desculpa aos habitantes e proprietários da serra de Monchique) terá sido… o acaso (como o mega-incêndio do Verão, precisamente em Monchique, sugere, se não comprova). Outra razão de peso reside no facto de que, sempre que num ano há grandes incêndios, no ano seguinte, porque o que ardeu não pode voltar a arder no imediato, há necessariamente menos fogos com proporções dantescas.
Contudo, este Outubro que findou não foi um mês de temperaturas nem de chuvas tipicamente outonais, de acordo com os registos (e segundo o que as pessoas têm, ou imaginam que têm, gravado na memória), bem pelo contrário. No Minho é ainda comum, entre os antigos, o ditado «em Outubro pega tudo», aplicado a sementeiras e plantações que a franca humidade e temperaturas amenas estimulavam a germinar e a crescer. Foi assim, mas já não é como soía. O Outubro que passou, quente e seco, foi-o quase até ao seu termo e só então houve episódios de chuva bem chovida. Estas chuvas eram necessárias para lançar à terra as culturas de Inverno, que agora alguns fazem num nico de terra, em pequeninos quintais ou hortas, mais por vontade e nostalgia ou para espairecer do que na expectativa de proveitos rendosos.
O tempo que temos será efeito de alterações climáticas decorrentes da acção humana (acção antrópica), que muitos afirmam e fundamentam e alguns negam. Para bom esclarecimento convém salientar que, na realidade, o clima não é estático, e oscila, como oscilou sempre ao longo do tempo - não há quaisquer dúvidas acerca disso - em variações de amplitude diversa, em consequência de muitos factores, cuja influência é difícil de medir com exactidão, cada um por si, e mais ainda no seu conjunto. E isto tem que ser dito claramente, com a mesma clareza com que se deve afirmar que os indicadores disponíveis apontam para variações desfavoráveis, eventualmente extremas, devidas à acção antrópica. Ou seja: o ser humano parece estar a desencadear ou acelerar extremos climáticos a cuja inclemência ficará sujeito, (muito) mais cedo do que tarde. Por via das dúvidas, no mínimo, devíamos ser prudentes.
E em matéria de prudência ambiental e climática, e mesmo económica (que não estrita nem imediatamente financeira) mas, sobretudo, de qualidade de vida indispensável, o ordenamento e a gestão do património florestal reclamam atenção particular, por estarem longe do esclarecimento e das resoluções que há muito tardam. Se os Outonos se perdem, enquanto estações do ano, que não se percam as perspectivas de futuro da humanidade.
Mas o problema está difícil.
José Batista d’Ascenção
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