Caretos de Mizarela. Foto de Js Rocha, colhida no «Facebook». |
Não fosse a «máscara» que afivelamos todos os dias e o mundo era diferente. Se fôssemos sempre iguais a nós próprios e reagíssemos por impulso desagradaríamos vezes em excesso e as relações sociais eram menos corteses e mais desagradáveis. Faz parte da educação o polimento de atitudes e comportamentos perante os outros. Educamo-nos desde sempre, com mais ou menos eficácia e proveito. É uma necessidade, provavelmente uma condição biológica de uma espécie que pensa.
Mas as regras funcionam melhor se admitirem excepções, pelo menos em certas alturas. Se fossem rígidas e invariáveis, as normas tornavam a vida fria, pré-determinada, rotineira, pouco autêntica e insuportável. Era um risco. O ser humano precisa de imprevisto, de emoção, de indeterminado, de surpresa, de aventura e de transgressão. As festas, mesmo minuciosamente programadas, cumprem em parte essa função, enquanto manifestações de alegria, de partilha, de convívio, de contacto, de proximidade e de intimidade.
O «Entrudo», como lhe chamávamos, ou «Carnaval», como o passámos a designar, é um tempo concedido pelas sociedades humanas ao excesso, à folia, à possibilidade de cada um poder tirar o «disfarce» do dia-a-dia, ainda que sob uma máscara carnavalesca, para se expandir e dar largas à sua fantasia ou «loucura», vertentes contidas ou reprimidas da autenticidade de cada pessoa. O Cristianismo teve grande influência na definição do calendário e, por isso, se delimitou um período propício à licenciosidade, até no interior do clero, para depois se impor disciplina formal mais forte durante a quaresma. Na política, desde sempre se percebeu que é preciso dar ao povo «pão e circo».
Pelo Carnaval ninguém leva a mal, dizia-se. E a todos e cada um se foi permitindo o que, de outro modo, teria que ficar no domínio do privado ou no foro íntimo.
O bicho Homem/Mulher é como é e temos de (saber) lidar connosco, enquanto indivíduos e enquanto grupos. Até agora, temos aprendido mal. Mas as coisas nunca foram mais fáceis no passado do que nos tempos que correm.
Hoje é dia de mudar de máscara ou de nos libertarmos dela.
Amanhã é quarta-feira de cinzas, mas ainda temos várias horas.
José Batista d’Ascenção
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