Encontramo-nos a meio da manhã de Domingo e conversamos até à hora do almoço. Somos três, quatro, cinco ou seis, mas já fomos mais. Todos professores do ensino secundário aposentados, excepto eu, que continuo na labuta. O grupo reúne-se há vários anos, em cafés de ambiente simpático e propício. Já tivemos vários poisos, para variar o espaço e a ambiência. As conversas vão da política (segundo várias sensibilidades de gente moderada, incluindo os desiludidos que deixaram temporariamente de votar e os que não admitem abdicar da prática desse direito), ao ensino (área em que nos definimos como «vencidos do ministério da educação») e ao desporto, mais comummente o futebol, domínio em que sou (consensualmente) o mais incompetente (e pouco interessado, tirando alguma atenção aos gastos faraónicos dos clubes, às suas monstruosas dívidas e à necessária corrupção, nunca resolvida).
Em duas horas de conversa percorremos o mundo, sentenciamos instituições, organizações e pessoas, de modo expedito e sumário, às vezes de modo consensual, outras nem por isso.
O decano do grupo é António Bastos que, com a sua memória precisa, faz o contraponto entre o que foram os tempos desde a ditadura e da guerra colonial (que fez, na Guiné) e o que é a actualidade, parecendo que o país tem certa apetência pelo regresso ao autoritarismo e à falta de liberdade de antanho, com a escola que temos a contribuir para isso.
O A. Antão é o homem das «finanças», que esclarece sobre impostos e poupanças. E também se pronuncia veementemente sobre desporto. É ainda uma «autoridade» em filatelia. Para além disso, dá explicações gratuitas e claras a muitos jornalistas (de jornais de referência) sobre léxico e gramática, que nem todos nem sempre agradecem, embora muitos o façam. Relativamente à imprensa regional e local desistiu, por não ter tempo nem braços para tamanha tarefa.
O Toni R., o D. Loureiro e o L. Guerreiro faltam e aparecem imprevistamente, nunca sendo os primeiros a chegar. O Toni, senhor de humor fino, quando chega recebe sempre com indulgência a pergunta dos presentes sobre se não precisam de se levantar, logo, permanecem sentados. O Loureiro é um homem das pedagogias e das viagens e um conhecedor do futebol, que praticou, dando opiniões a propósito, com ponderação e moderação. O Guerreiro, muito ocupado com as edições dos manuais escolares da equipa a que pertence, aparece quando pode e recorda sempre saborosos trechos das suas vivências cívicas e escolares. Veja-se este exemplo: Nos anos seguintes ao 25 de Abril, havia no Minho certa senhora, já com alguma idade, que nunca tinha visto o mar. Por imperativo de generosa solidariedade, cavalheiros disponíveis levam-na gratuitamente até à praia de Esposende. Chegados ali, a anciã põe a mão em pala, fixa os olhos no horizonte líquido e exclama: «Ai meninos, que puta de poça!»
Pelo meu lado, bastante ignorante de todas as matérias, dedico-me (mais) a ouvi-los e a apreciar o humor de cada um, o que faço com muito gosto.
José Batista d’Ascenção
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