Fomos uma roda de amigos que frequentava «Os Coelhos». Sentávamo-nos e recebíamos em festa cada um que ia chegando. Eram ao fim-de-semana, os nossos encontros. Um destes dias ocupei eu, apenas eu, a mesa a que costumávamos iniciar cada confraternização. Então, parecíamos indiferentes à seta do tempo, mesmo quando começou a faltar um, depois outro dos convivas… Faltas definitivas, pelas leis da vida ou da saúde. Nunca falámos dos faltosos, como se fora impossível desocultá-los do peito. Vieram rugas e cabelos brancos, alargou-se a calvície, diminuíram os empolgamentos clubísticos do futebol e passámos a mostrar fotografias dos netos.
O senhor Miguel e o irmão sempre nos trataram familiarmente, como aos outros clientes. Depois, por saturação do senhor Pedro, o senhor Miguel ficou só, talvez mais apoiado pela esposa. Agora também ele arrasta uma das pernas, sem ter perdido a jovialidade de sempre. Quando, pela primeira vez, reparei, impensadamente, perguntei-lhe como tinha ficado assim. Respondeu-me que já estava muito melhor… e assim calou a minha inconveniente curiosidade.
Culpei a passagem do tempo, e senti mais agudamente a falta de outras caras, vozes e sorrisos. Voltei a culpar o tempo.
Desta vez, o senhor Miguel trouxe-me à mesa o segundo livro de poemas do filho, seu homónimo, a criancinha que há uns anos cirandava entre as mesas. Folheando-o, e lendo a primeira meia dúzia de composições, senti que é este outro tempo e que não há mais que aceitar a sua marcha.
Não pára o mundo. Nem nós paramos nele.
É assim. Ponto.
José Batista d’Ascenção
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