Refugiados da guerra na Síria. Foto: ACNUR / Guardacosteira italiana / Massimo Sestini. |
Hoje quase poderia dizer que nada me falta: não tenho dores, os filhos estão connosco, abundam as provisões de comida, a casa é confortável, a saúde dos membros da família e amigos é globalmente razoável (os que mais padecem compõem nesta quadra um ar mais terno e mais doce), vão-se gerindo com mais ou menos dificuldade as carências materiais de um ou outro mais próximo, de modo que até é legítimo pensar: antes assim que pior.
Mas há os muitos que passam fome e sofrem os rigores do frio e da solidão gelada da alma; os que perderam familiares e haveres por via de catástrofes, nem sempre inevitáveis, como os incêndios que não curamos de prevenir; os que perderam o emprego e desesperam por um modo de vida minimamente digno, para si e para os seus filhos; aqueles a quem a doença retira o prazer da vida, pelo sofrimento excruciante ou pela perspectiva da morte próxima; os que, emigrados, estão longe da família e dos amigos, em consequência das voltas da vida e, na maior parte dos casos, com o fim de resolver situações de precariedade ou penúria; os pais que fogem em desespero com crianças pequeninas, porque os sanguinários do poder e da guerra não dão tréguas nem têm contemplações; as crianças que, perdidas dos pais, fogem sozinhas ou com outras crianças, de que procuram tomar conta; e também aqueles que, sem culpa própria, caíram nas garras da (in)justiça, ou que se vêm em situação prisional por actos de revolta ou de loucura humanamente compreensíveis (em Portugal nem tanto…); e os que, nas sociedades da abundância e mesmo do luxo, são explorados ou escravizados e desprezados por gente de egoísmo transbordante e barriga farta, mas pobre de princípios e de sentimentos.
E, entre todos, há aquelas (muitas) crianças a quem (re)tiramos a possibilidade de serem adultos com futuro e cidadãos de pleno direito, agrilhoados que vão ficar ao analfabetismo e à ignorância.
A todos esses dedico estas linhas, como se fora uma prece, inspirado na figura do Menino Jesus, primeiro do presépio e depois do evangelho, que me marcou desde pequenino.
Esforço-me por alimentar a esperança de que a humanidade evolua no sentido do respeito por por cada pessoa em si mesma, pelos outros seres vivos e pelo lugar a que pertencemos - o planeta que tanto maltratamos - num tempo que não sei quando chegará. E homenageio os que não desistem de pensar e desejar que não pode deixar de ser assim e procedem com essa intenção.
Por isso, a todos os (que se sentem) desprotegidos (que somos quase todos em diferentes momentos da vida) ofereço o meu abraço humilde e fraterno.
José Batista d’Ascenção
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