Cheguei à idade de ser avô e já levo mais de quarenta anos na profissão que escolhi e de que não me queixo (embora a minha opção tivesse sido outra, se soubesse o que hoje sei). Tenho filhos maravilhosos e netos que me fazem sentir no céu. A Lurdes, minha mulher, que o diga. A ela estou grato, pelos frutos e pela companhia e amparo no percurso. A minha irmã mais velha deixou-nos imersa num oceano de doenças, na mesma idade, em anos e meses, que eu acabei de atingir. Sou órfão de pai, mas ainda tenho mãe, já bastante fragilizada.
Sou um privilegiado.
Há década e meia, exames eco e radiológicos mostraram-me que num corpo sem sintomas facilmente se desenvolve algum tipo de mal fatal. O cirurgião foi lesto, em Abril esventrava-me do lado direito, a bisturi, num rasgão de palmo, e em Junho, repetia o processo do lado esquerdo. Perceberamos que a causa era cromossómica, pelo que a doença ressurgiria, mais cedo ou mais tarde. Todos os anos temos olhado para o evoluir do processo e sabemos que as (poucas) opções não são fáceis nem agradáveis.
Ontem, o filho mais velho quis falar longamente comigo. Como eu aconselhara, desde a ida à faca, ele e o irmão deviam fazer exames de despiste quando se aproximassem dos quarenta. Ele não esperou tanto. Dias antes do Natal, invocando condicionalismos de trabalho ficou em Nova Iorque, enquanto a mulher e os meninos vieram ao rectângulo, para consolo dos familiares pátrios, especialmente os avós. Afinal, soube há poucas horas, fizera intervenção similar às minhas, mas com metodologias e técnicas muito mais modernas e menos invasivas. Falou com uma serenidade e coragem impressionantes (se assim não for disfarçou impecavelmente). Enviou-me os resultados dos exames que fez e disse que ia agora ter uma conversa com o irmão.
A síndrome tem o nome de Birt-Hogg-Dubé. A probabilidade de transmissão aos filhos dele é igual à probabilidade com que lha transmiti a ele (e não sei se ao irmão): 50%. Saber desta realidade quantificada ensombrou-me.
Por mim, estou bem, já vivi muito e sou um homem de sorte, quando morrer, morri apenas. Mas, a meus filhos e netos falta viver. E como eles merecem viver!
José Batista d’Ascenção
Recebe um abraço gigante meu querido Zézito🧡 Que tudo corra pelo melhor possível para vocês todos🙏
ResponderEliminarUm obrigado imenso. Com muito carinho.
EliminarSó posso dizer :.muita coragem. Rezo por vós.
EliminarUm abraço grande e amigo da Luisa e meu
Muito obrigado, Carlos. Um grande abraço para si e para toda a família.
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