quarta-feira, 29 de julho de 2020

Eu, o “facebook” e o obrigado que devo - e sempre deverei - ao Professor Galopim de Carvalho

Um dos muitos livros do Professor Galopim,
que torna a geologia bela e... fácil.
Eu não tinha nenhuma apetência parar aderir ao “facebook”: Ideias prévias de exposição da vida pessoal e familiar, de certo exibicionismo (que contraditoriamente contemplo com deleite no que respeita à beleza feminina), da disseminação de ressentimentos e ódios, da multiplicação de “notícias” falsas e da redução do pensamento a impulsos egotistas repeliam-me.
Mas eu estava fascinado pelos textos do Professor Galopim de Carvalho, que lia em vários blogues - o seu (“Sopas de Pedra”) e outros (“De Rerum Natura”, “Sorumbatico”), em livros da sua autoria e em artigos de jornal. Pelos comentários que uma ou outra vez deixei naqueles blogues, deve ter-se tornado claro para o Mestre que eu e outros professores como eu estávamos ávidos e (muito) precisados de aprender um bocadinho mais e de melhorar a qualidade do que ensinamos aos alunos do ensino básico e secundário.
Entretanto, ele tinha alargado ao “facebook” a divulgação científico-pedagógica e histórica e culinária e de cultura geral que sempre praticou e estava muito satisfeito com o eco que obtinha. Vai daí, encorajou-me a aderir e a tornar-me seu “amigo” naquela rede social.
Segui o conselho. Mas o sistema respondeu(-me) que não era possível, porque os pedidos de “amizade” excediam em grande número o limite permitido. Comuniquei-lho e, de imediato, ele forneceu a solução: que lhe desse os meus dados e era ele que me fazia um pedido de “amizade” a mim. Assim foi.
E desde então, eu, que nunca pedi “amizade” a ninguém, nem no “facebook” (ou, se pedi, foi sem querer…) nem em qualquer outra circunstância, excepto ao Professor Galopim, por sentir que não correspondo (minimamente) aos perfis compatíveis com as redes sociais, tornei-me um frequentador (não compulsivo) do “facebook”, onde, como era (facilmente) previsível, encontrei outras pessoas que muito aprecio e com quem muito aprendo.
A acção pedagógica, científica, ética, cívica e cultural de pessoas como o Professor Galopim é inestimável. E eleva o nível de qualidade de qualquer meio de comunicação de que se sirvam.
Isto sabe bem e faz-nos melhores e é um gosto afirmá-lo. E também um dever.

José Batista d’Ascenção

domingo, 26 de julho de 2020

A minha Terra calcinada

Imagem obtida aqui.
Tudo é fumo e labareda. Resta o negro. E as almas vazias. Àqueles que permaneceram, verga-os o peso da idade, da solidão e da indiferença (ou da ineficácia) dos que podem. Eles sabem que estão sós. Por isso olham para o infinito, em silêncio, a interrogar Deus, ante a perplexidade da desesperança completa. Porque os abandonaram? A eles, que nunca pouparam braços e esforços e a quem nunca faltou a fé?
Ninguém sabe. Ninguém responde. Ninguém resolve.
E eles mesmo são ninguém. Aquelas terras são de ninguém. São nada: eles e as suas terras e as suas coisas e as árvores e os animais que havia. São nada e ninguém, embora incomodem um pouco, quando exteriorizam tanto sofrimento mudo.
Deixemos, o Verão vai a meio. Mais mês e meio e passou. Tudo é coisa de nada. Voltará, mas já sabemos o que é e a importância que lhe damos. Por isso não faremos nada.
Sofro convosco, e grito calado, gente da minha Terra calcinada.

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 21 de julho de 2020

Durante o dia e no mesmo lugar, quando pesamos menos e porquê

Imagem obtida via «Google»: aqui.
Pessoas que durmam entre as 23-24 horas e as 06-07 da manhã, e se alimentem e se mantenham activas durante o dia, na maior parte dos casos, é depois de se levantarem que têm peso mais baixo. Esse mínimo diário do peso pode, no entanto, ocorrer após grandes e prolongados esforços físicos, numa jornada de trabalho esforçado, de um mineiro clássico, suponhamos, ou numa prova desportiva violenta, como uma difícil etapa de ciclismo ou uma prova de maratona.
O peso do nosso corpo corresponde à quantidade de matéria que o constitui mais aquela que, através da alimentação e da bebida, introduzimos nele. Quando acabamos de comer e/ou beber aumentamos de peso na exacta medida da quantidade de alimento e dos líquidos que ingerimos. Quando, por outro lado, satisfazemos as necessidades fisiológicas de excreção (fezes, urina) perdemos nem mais nem menos que o peso do material eliminado.
Porém, as perdas de matéria e do respectivo peso processam-se ainda de outros modos. Pela pele e pela respiração (mais propriamente pela expiração) libertamos continuamente água (na forma líquida ou de vapor) em quantidade que depende das condições do clima, designadamente da temperatura, e do maior ou menor esforço que fazemos. A água que expelimos pela urina e pela pele, pelas lágrimas e até aquela que amolece as fezes, contém substâncias dissolvidas que entram igualmente no cômputo da massa que se perde pelos processos fisiológicos.
O funcionamento das células de cada um dos nossos órgãos e a coordenação do organismo como um todo consomem continuamente energia. Ao metabolismo energético mínimo, correspondente a uma espécie de custo-base por estarmos vivos, chama-se metabolismo basal. Os compostos orgânicos dos alimentos, para além de elementos de construção do corpo, e especialmente uma categoria deles, designados por glúcidos (amiláceos e açúcares), têm a função de fornecer essa energia, ao serem degradados («queimados»), da mesma forma (embora faseada e controlada, para evitar o sobreaquecimento) que o é qualquer combustível (seja a lenha numa lareira ou a gasolina num motor de um veículo). Trata-se pois de combustíveis das células. A sequência de reacções de degradação (ou catabolismo) dos glúcidos pode resumir-se deste modo:
6C6H12O6 (glucose) + 6O2 (oxigénio) → 6CO2 (dióxido de carbono) + 6H20 (água) + 36-38 ATP (iniciais do nome da molécula universal – Adenosina Tri-Phosfato - que armazena e transfere continuamente a energia no metabolismo de quaisquer células).
Esta reacção não é mais do que o processo de «respiração celular» que, como o nome indica, ocorre no interior de todas as células (o que vulgarmente chamamos respiração corresponde apenas à ventilação pulmonar, pela inspiração e expiração).
De acordo com aquela reacção, as nossas células estão continuamente a consumir compostos orgânicos (como a glucose) na respiração celular e a transformá-los em dióxido de carbono e água. O dióxido de carbono é perdido ao nível dos pulmões, pela expiração, e a água é perdida por esse processo e por todos os outros antes referidos: produção de urina, transpiração, etc. Então, durante a respiração celular, estamos continuamente a degradar e a perder matéria, ou seja: a perder peso (convém esclarecer que todo o dióxido de carbono libertado se traduz em perda de peso, já que os seus elementos químicos faziam parte da glucose, ao passo que a água formada neste processo só parcialmente contribui para a diminuição do peso, porquanto o oxigénio que a constitui provém das moléculas de oxigénio inspirado).
Assim, no intervalo das refeições, de cada uma à seguinte, se não bebermos, vamos ficando mais leves, mesmo sem urinar ou defecar e ainda que não tanspirássemos.
Como o tempo de sono nocturno é habitualmente o mais longo intervalo de jejum, é depois dele que, na maior parte dos casos, atingimos um peso mais baixo.
Naturalmente, para termos um peso desejável, nada como uma alimentação equilibrada e um programa de exercício físico adequado.

José Batista d’Ascenção

domingo, 19 de julho de 2020

Uma manhã fresca após dias de canícula

Imagem obtida aqui.
A falta que fazem as árvores, espaços verdes e jardins arborizados, próximo dos edificados urbanos, para além da floresta não contígua às habitações (floresta que não pode confundir-se com a monocultura de uma qualquer espécie arbórea altamente inflamável como o eucalipto ou o pinheiro bravo), porque as plantas amenizam a temperatura, devido à libertação contínua de vapor de água e à produção de sombra, renovam o oxigénio e são um refrigério para a vista!
Após vários dias de calor infernal, devíamos ter a noção disso mesmo. Felizmente, hoje, em Braga, amanheceu com frescura, o sol demorou a dissipar o nevoeiro do [rio] Cávado e as temperaturas mantiveram-se mais baixas, dentro dos intervalos de agradabilidade fisiológica. À hora a que escrevo ainda sinto os prazeres da frescura natural, que saboreio de portas e janelas abertas, exposto à corrente de ar.
Os incêndios, muito agravados pela péssima gestão que fazemos do espaço florestal, devem contribuir significativamente para o aumento da temperatura, pelo calor que libertam. Além dos prejuízos enchem a paisagem de negro e a atmosfera de fumo, consomem oxigénio e libertam dióxido de carbono e deixam os solos nus e desprotegidos para a erosão que há-de afectá-los às primeiras chuvas. Perdemos de todos os modos, incluindo vidas humanas e outras, mesmo que haja negócios associados ao fogo.
Passamos mal e somos, em boa parte, responsáveis por isso.
Nesta manhã de Domingo, mais fresca, dediquei uns minutos a pensar no assunto.

José Batista d’Ascenção

quarta-feira, 15 de julho de 2020

As contas da Covid-19

Imagem obtida aqui.
Segundo dados da Worldometer (via relatórios diários da situação, da DGS, é trabalhoso chegar aos dados em que fundamentamos a nossa análise), ontem, dia 14, registaram-se em Portugal 233 novas infeções e mais 6 óbitos. Consequentemente, devido a uma quantidade não habitual de 485 recuperados, que superou, por muito, a soma dos números de novos infetados e falecidos, o número de casos ativos baixou 256, realidade a que não se assistia, desde 30 de junho, dia em que foi registada a última descida considerável de 79 casos. A norma vinha sendo a subida diária, por conseguinte.
E, num dia excecional de descida do número de casos ativos, o que é que continuamos a ter nos títulos da imprensa e nos oráculos das televisões? Nada mais do que o massacre diário do somatório de infetados e de falecidos. O número de recuperados e o importante número de casos ativos continuam a não merecer qualquer relevo nos nossos pobres órgãos de informação!
Mas mais. Segundo notícias publicadas nos jornais de hoje, “a Direcção-Geral da Saúde fez, esta terça-feira, a atualização da distribuição dos casos por cada concelho no [seu] boletim diário”. Fomos ver o que nos interessa mais diretamente e pudemos constatar que, ao fim de mais de um mês (desde 6 de junho), lá fazem o favor de atribuir ao concelho de Braga mais 4 casos (os persistentes 1.256 passaram, finalmente, para 1.260). 
Só que o Correio do Minho, que vem noticiando a situação no concelho com mais rigor e objetividade, por ação de uma jornalista que interage com a autoridade municipal, informa hoje que “Braga registou, na última semana, mais dez novos casos de Covid-19”, o que faz com que “desde o início da pandemia já foram infetados 1.409 bracarenses”. Mas acrescenta que também se registaram “mais dez recuperados”. Então, em posse destes números, que descredibilizam por completo a informação da DGS, a jornalista faz as contas e informa os munícipes de Braga sobre aquilo que é mais importante e que todos mais querem saber: “apenas 22 estão com a infeção ativa”.
Mas no que concerne à informação sobre a evolução da pandemia a nível mundial, temos mais. Vimos assistindo, nos tempos mais recentes, a um aumento incontestavelmente assustador no número total de infeções, números estes que são diariamente noticiados com grande alarme e sensacionalismo pelos nossos órgãos de comunicação. E não há quem consiga ver e noticiar que, por norma, cerca de 60% do total de infeções ocorrem em três países: EUA, Brasil e Índia. E, se juntarmos a África do Sul, que entrou recentemente no grupo dos dois dígitos diários, temos que aquela percentagem sobe para cerca de 65% (no dia a que nos referimos estes números foram, 63,6% e 68,5%, respetivamente). E também podiam acrescentar, se quisessem ser rigorosos e não panfletários, que são 215 os países/regiões elencados pela Worldometer e só mais 18 (além dos 4 referidos) é que ontem registaram mais de 1.000 novos casos positivos.
Entretanto, entre os muitos milhões de infetados, há também muitos milhões de recuperados. Eram, no dia em referência, quase 7,8 milhões. Se juntarmos a este número o dos falecidos, tínhamos ontem menos de 5 milhões de casos ativos, no tal mundo dos 13,3 milhões de infetados!
Mas que interesse tem isto? Que interesse tem noticiar o lado menos negativo do problema? O que interessa é o estrondo dos mortos e feridos e internados.

António Antão

sexta-feira, 10 de julho de 2020

Um abraço improvável

Imagem recortada daqui.
Meia hora antes da hora marcada cheguei. Feitos os registos do momento e as perguntas prévias (cirurgias anteriores, alergias, se era fumador, se bebia regularmente, se tinha diabetes, a que se seguiu a típica picada no dedo), marcado com caneta o lado da cara onde havia de ocorrer a intervenção, colocada a pulseira plástica, com nome e número, no pulso desse lado, e a agulha em veia da mão do lado oposto, voltei para o espaço onde havia de aguardar.
Neste entretempo, assisti à dor funda de alguém que recebeu notícias que não desejava (ou que temia?) e começou a doer-me aquela dor. Levantei-me, aproximei-me e, por detrás da máscara, desajeitado, ofereci-me para ir buscar água à máquina ali perto. Uma das meninas do guichê veio prontamente substituir-me naquele papel, e com mais eficácia do que eu. Corriam lentos, os minutos. Pedi à Lurdes, minha mulher e solícita acompanhante, que me deixasse, por me parecer que não adiantava continuar ali. Para ocupar o vazio do pensamento, li umas páginas de «o doente inglês».
Cerca das catorze horas fui chamado para me equipar com cuecas de rede, bata azul sintética, fina e leve, e uma espécie de meias algo ásperas. Levado o saco com os pertences, foi assim que me deitei na cama que seguiu por corredores refrigerados. Parei e esperei. Esperei bastante. Puxada a coberta, sentia-me confortável. Pessoas circulavam, perguntavam, pediam, um paciente, empurrado numa cama, gemia alto e em contínuo: «maria-ó-maria-maria-mariiiia», e seguiu para onde o levaram. Dei comigo a pensar na “seta do tempo” que, ou tinha parado, ou tinha um destino tão longínquo que parecia não mais o alcançar. A certa altura alguém chegou e poisou a cabeça no ombro de outra pessoa que permanecia ao meu lado. Trocaram um abraço. Como os meus olhos estavam abertos, e nada incomodados, cruzaram-se com os da pessoa que tomara a iniciativa daquele enlace afectivo e breve, que me disse: «a si não posso abraçá-lo». Julgo que terei sorrido e saiu-me, sem pensar: «e eu que tanto agradecia». Num ápice, aquela excelente pessoa baixou a guarda da cama do meu lado esquerdo e depositou sobre o meu peito um abraço de carinho, que senti no coração. Não sei se aquele abraço quebrou alguma regra ou não, mas se quebrou, ainda bem. Também não sei quem mo deu, mas isso não impede que esteja grato a quem mo ofertou. O corredor ficou menos frio. Quando entrei no bloco e fiquei debaixo dos projectores, olhei aquelas jovens médicas e apenas perguntei as horas. Eram quinze e vinte. Colaborei o melhor que pude nas inspirações fundas, sob a máscara da anestesia no extremo do tubo flexível e não me lembro de ter adormecido.
Durante o recobro senti-me incorpóreo, sem indisposições.
Agora, em casa, vou recuperando, com o enorme desejo de que o mundo não se torne excessivamente silencioso para mim. 

José Batista d’Ascenção

quarta-feira, 8 de julho de 2020

A alma cheia da gente – homenagem pessoal ao Hospital de Braga e ao Serviço Nacional de Saúde

Fonte da imagem: aqui.
Apontamento que fiz hoje (e que volto a escrever de memória) no Hospital de Braga, no serviço de otorrinolarigologia, após intervenção feita na tarde de ontem num dos meus ouvidos:

- Às ex.mas senhoras e senhores funcionários;
- Às ex.mas senhoras e senhores administrativos;
- Às ex.mas senhoras e senhores enfermeiros;
- Às ex.mas senhoras e senhores médicos é às suas equipas.
Tendo sido internado dia 07 de Julho e tido alta no dia seguinte deixo a todos (e a quem involuntária e injustamente tenha deixado de fora) um abraço de sentida gratidão.
Faço este escrito também em homenagem singela ao sistema nacional de saúde, mormente em tempo de virose pandémica.

Assinatura: …

Nota adicional: A ordem das citações feitas foi aquela como podia ter sido a inversa. Parabéns.

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 7 de julho de 2020

Consumições deste Verão

Fonte da imagem: aqui.
Os fogos que ameaçam. Os ingleses que (já) não vêm para o Algarve. Os emigrantes que não vão conseguir deixar de vir de férias e assustam o interior, por causa da virose pandémica. O mesmo para os que moram na capital e têm vontade de “ir à terra” que os viu nascer, até pela falta de alternativas e de dinheiro, enquanto outros, com a carteira mais composta, “descerão” provavelmente até ao Algarve, não sem riscos de multiplicar os contágios.
Parece que, entre nós, a doença da actualidade fugiu ao controlo, por razões várias: lares ilegais e em condições precárias, habitações más, transportes públicos que são armadilhas sanitárias (o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, terá aqui especiais responsabilidades, que devia assumir) e empregos onde as regras, desde logo a comunicação obrigatória dos casos de doença, não serão cumpridas. Políticos, entidades da direcção geral de saúde e especialistas, porque desconhecem as soluções, não têm certezas nem coincidem nas metodologias a recomendar. Muitos cidadãos não levam a sério os cuidados que se sabem necessários e políticos há que dão mau exemplo.
Acresce o problema do desemprego: o que já é efectivo e o que paira sobre as pessoas.
Num quadro assim, é mais importante do que nunca atentar nos bons exemplos. Na escola onde trabalho, os funcionários têm sido escrupulosos e exemplarmente dedicados na desinfecção dos espaços e nas precauções a tomar e a fazer cumprir. Os profissionais de saúde têm correspondido (e não fica bem nem é oportuno, neste contexto, reclamar aumento de honorários dos médicos, como medida de reconhecimento do esforço). Por outro lado, a generalidade das pessoas mantém a vontade de contribuir para a solução do problema.
Que chegará, embora desconheçamos os custos, em sofrimento, vidas perdidas, e dificuldades económicas. O que não pode toldar-nos o discernimento e o sentido de solidariedade. 

José Batista d’Ascenção

domingo, 5 de julho de 2020

A realidade e o que percebemos dela

Imagem obtida aqui.
Os sentidos iludem-nos. As percepções são subjectivas. Os raciocínios falham. Vemos o mundo pela nossa medida. Os nossos semelhantes, bastas vezes, enganam-nos. E cada um de nós (semelhante de todos os outros) paga na mesma moeda.
É biológico e social.
Por isso (ou para isso) se criaram os princípios éticos, os códigos de honra, os fundamentos filosóficos e religiosos, os sistemas de educação e de justiça.
E a política.
A ciência é outra coisa, e não lhe cabe responder à essência do bem e do mal
Evoluímos, às vezes mais na aparência do que na substância. E com tendências regressivas à condição medular, expostas repetidamente.
Entre progressões e retrocessos, estragámos a casa comum que, para além de nós, abriga os viventes de todas as espécies.
Temo que irremediavelmente.

José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 3 de julho de 2020

O ontem esquecido e a perplexidade de hoje. Amanhã o que será?

Imagem obtida aqui.
Nas últimas quatro ou cinco décadas, nos países com níveis de vida razoável, e exceptuando aquela fracção de pobres - um quinto dos portugueses, pelo menos -, que quase culpamos de o serem, habituámo-nos à mesa farta (tanto que os portugueses engordaram excessivamente), à saúde garantida (abençoadas vacinas e antibióticos, bendito sistema nacional de saúde!), e à liberdade (fruto precioso do 25 de Abril, de que ignoramos o preço).
Neste intervalo de tempo, a juventude deve ter tido as maiores facilidades de toda a História da humanidade. Uma vivência hiperprotegida: pelos pais, que tinham tido vidas mais ou menos apertadas e queriam o melhor para os seus filhos, pela sociedade que, formal e legalmente, passou a proteger as crianças, e pela instituição escola, que se tornou obrigatória para todos, embora cumprindo mal o seu papel. Com espanto apercebemo-nos de que, em vez de robustecida, a formação do género humano se revela nuamente frágil, como sempre foi e é.
As pessoas que entram agora na terceira idade podem não ter tido infâncias e juventudes muito confortáveis, mas, tendo trabalhado, e à falta de melhores perspectivas, anseiam pela reforma (que os adiamentos vão protelando), convertida em motivo esperançoso de vida.
Já os mais velhos, para além dos oitenta anos, que, na maioria dos casos, sofreram as passas do Algarve, poderiam saborear o tempo plácido das suas pensões, se a saúde o permitisse e a ajuda a filhos e netos não lhes consumisse os recursos e ensombrasse os dias.
A população activa faz «ginástica» na aplicação dos proventos e vive temerosa de perder o trabalho, sujeita ao martelar terrorista de que não há empregos para a vida (excepto os dos que propalam a ideia).
Configuram-se pouco auspiciosas e entusiasmantes as perspectivas de futuro dos mais jovens, que as famílias não sabem como educar, que as escolas enganam com sucesso fictício e a quem a sociedade sonega a possibilidade de integração em funções úteis e gratificantes.
A agravar tudo, fomos surpreendidos por uma infecção pandémica, que o conhecimento da História e o saber da Ciência facilmente permitiam prever, embora não pudessem datar.
A vida é uma luta constante, quase sempre dura e difícil. É nosso dever vivê-la e ensiná-la. Não há outra via. Nunca houve. E os erros têm custos que alguém inevitavelmente pagará – os que os cometeram ou outros por eles. Também a transgressão e o crime frequentemente compensam, mas não em definitivo, sendo que algum tipo de paga facilmente transita para as gerações a haver. As agressões à mãe Natureza incluem-se aqui.
Tudo isto, muitos de nós temo-lo arredado do pensamento.
Para amanhã, contudo, não resta ao ser humano mais do que aquilo que possa fazer por si mesmo. 

José Batista d’Ascenção