sábado, 23 de dezembro de 2023

Sapatos de cão e crianças sem sapatos, sem paz e sem pão

Hoje à tarde, enquanto fazia o meu exercício físico ao ar livre, na margem esquerda do Cávado, entre a Ponte de Prado e Ruães, reparei num cão de tamanho médio todo apetrechado para o frio que não fazia – o sol era claro, o ar macio e a temperatura amena. Pois aquele cão seguia junto aos seu jovens donos (suponho) abrigado debaixo de um cobertura avantajada a que, por analogia com os sobretudos (peças de roupa para humanos), chamarei de «sobrepêlo». Mas, o que me chamou a atenção foi que aquele cão usava sapatos. Procurei reparar melhor, entre cada ida e vinda do meu percurso: não, não conhecia calçado com tal uso. Interroguei-me sobre se seria para evitar sujar o chão da casa, dado que não era pela aspereza do solo nem por este estar demasiado frio ou quente (o asfalto, no Verão, pode ser um problema…). Também me perguntei se o cão preferiria andar naturalmente como cão ou como cão «travestido» por mão humana. Nada podia concluir.

Porém, em época de Natal, saltou-me o pensamento para as crianças que não têm tecto, nem pão, nem família, nem quem cuide delas.

Claro que, se aquele cão não tivesse sapatos, isso nada adiantaria à situação das crianças desvalidas. Mas o paralelo não abandonou o meu espírito. De resto, uma tétrada de sapatos de cão talvez não seja assim tão cara… Por outro lado nem sei se os donos daquele cão ofereceram a alguma(s) criança(s) desprotegida(s) pares de sapatos muito mais dispendiosos do que tétradas de sapatos de cão. Nada sei. Além do mais, respeito os que se dedicam aos animais e lhes querem mais do que às pessoas. Este grupo é muito alargado, talvez universal, se pensarmos nos animais que são nossos e nas pessoas que estão longe e que não conhecemos. Somos assim. Porém, reflectir nisto causa-me impressão, que deve derivar das minhas múltiplas imperfeições. Imperfeições que incluem a impossibilidade de fuga ao consumismo na medida que suponho ideal.

Vivemos num mundo cão, diz-se, e eu tenho-o por verdade. Mas salientando que a culpa não é dos cachorros.

José Batista d’Ascenção

terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Cacto de Natal

Schlumbergera truncata é o nome científico do chamado cacto de Natal. Tem outras designações, por exemplo cacto da Páscoa. Segundo a Wikipédia, é uma planta originária do Brasil, que cresce até cerca de 30 cm de altura e não apresenta espinhos. As flores medem até 8 cm, e apresentam tons de rosa, branco, laranja ou vermelho. O caule é formado por vários artículos que podem ser destacados para formar novas plantas. Gosta de solo fértil e bem drenado, de boa luminosidade, sem sol directo.

O exemplar da foto mora nos fundos cá da casa. Ninguém lhe dedica muita atenção, eu rego-o de tempo a tempo com pouca água. A planta parece vingar-se e obriga-nos a reparar nas suas bonitas flores, quando é o tempo.

E este é o tempo do cacto de Natal ou o cacto de Natal é deste tempo que agora faz.

Em mensagem rápida, que os meus netos estão quase a chegar!, ofereço-o à vista de todos, como sinal de Boas-Festas.

José Batista d'Ascenção

sábado, 9 de dezembro de 2023

Dezembro, cai chuva miudinha

Dia cinzento e molhado, no Minho. Há quem deteste, eu aceito e penso nas vantagens. O tempo assim convida(-me) à reflexão. Precisamos de chuva (bem chovida) e temo-la, como devia ser próprio da época. E, chovendo, nem o frio é tão extremado. Talvez esta aguinha sirva para retardar os queixumes de seca, como é costume, daqui por seis meses, ou antes.

Por outro lado, os meus netos e filhos e filhas (as mulheres deles) estão quase a chegar. Cuido que o desejo deles não é inferior ao meu e ao da mulher. E, se continuar a chover, quando vierem, tanto dá: ficamos em casa e (ainda) estamos mais juntos. Se fizer bom tempo vamos passear e divertir-nos em espaço amplo, o que também sabe bem. Está quase! Na escola, as aulas vão interromper-se dentro em pouco. Os resultados dos meus cachopos são bastante razoáveis, pese aqueles (poucos) casos que não me deixam descansado. Mas estou cheio de sorte este ano. E é isso que interessa.

Venham os jovens e os mais jovens, não surjam problemas maiores de saúde ou outros e o Natal vai ser bom e feliz.

Boas Festas, de que tanto precisamos.

Eu já estou a saboreá-las.

José Batista d’Ascenção

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

O enigma da cultura

Menos imerso em leituras do que há tempos atrás, tenho lido os textos de Oliveira Martins, no livro «A cultura como enigma». É um homem de profunda cultura, o autor. E são interessantes os seus artigos, reveladores de muito saber, muitas vivências e muita(s) leitura(s). Tantas leituras que Oliveira Martins refere logo na primeira página: «Penso que o vício dos livros veio no meu código genético».  Uma frase de sentido forte e nítido, afectivamente (muito) verdadeira, mas factualmente falsa. Ninguém nasce com quaisquer genes para a leitura. É preciso berço favorável e uma infância com estímulo para o amor aos livros. Ninguém ama o que desconhece. Infelizmente, o ambiente familiar da maioria das crianças portuguesas não reúne as condições necessárias, e, por isso, globalmente, os portugueses não lêem. E, como não lêem, não gostam de ler. Como podia ser de outro modo?

A escola devia quebrar este ciclo, mas não é fácil consegui-lo. E cada vez parece mais difícil.

Por outro lado, a cultura não se dissemina por «osmose», de tal (má) sorte que a erudição e o saber, não raro, isolam os que os detêm num «espaço» a que as grandes massas são «refractárias», quando não mesmo algo hostis.

As democracias, para o serem, e para promoverem o humanismo e a cidadania, deviam tratar o assunto com toda a dedicação e cuidado. E firmeza.

A nossa, como outras, não tem sabido fazê-lo.

A responsabilidade é nossa.

Já o livro, esse vale a pena lê-lo.

José Batista d’Ascenção

Tempo de plantar

O Outono tem trazido chuva abundante, na metade norte do país continental.

Nas Ilhas não há problemas de seca. Há dúvidas sobre se gerimos bem os recursos hídricos: o excesso de água pluvial que não conseguimos reter; a falta de água na zona sul (onde chove pouco), que não conseguimos colmatar; a exploração excessiva de água subterrânea na orla algarvia; acrescendo a poluição de solos e cursos de água, tudo agravado pelos incêndios de Verão, que potenciam a erosão dos solos, o assoreamento das barragens e a contaminação das águas das albufeiras.

Porém, o tempo vai bom para plantar. Há cidadãos (individuais) que estão sensibilizados e fazem (muito bem) a sua parte. Mas falta política global, ordenamento florestal e ampliação e gestão da(s) área(s) de coberto vegetal autóctone.

Ocorrem algumas iniciativas simbólicas de plantação de árvores ou arbustos, quase sempre associadas à comemoração de «dias mundiais», que ficam bem na fotografia, por assim dizer, mas que convinha converter em algo que seja mais sistemático e efectivo (não importando que seja discreto e, desejavelmente, banal).

Ou plantamos diversificadamente os espécimes convenientes em cada região (basta de monocultura extensiva de eucalipto em qualquer sítio) ou os nossos filhos e netos não terão condições de sobrevivência.

Plantar - isto, que é óbvio, devia ser linear.

José Batista d’Ascenção