segunda-feira, 15 de julho de 2019

Boa música, pela Orquestra Filarmónica que Braga tem

Ontem, caminhava para as 22 horas, quando, na Praça do Município (uma das mais belas praças de todas as cidades que pude conhecer), teve lugar o «Concerto de Verão», com um alinhamento subordinado ao tema «Danças do Mundo», pela «Orquestra Filarmónica de Braga (criada apenas em 2014), sob a batuta do Maestro Filipe Cunha.
As peças executadas fazem parte de obras dos séculos XIX e XX, de autores diversos, de várias nacionalidades, a maior parte nomes grandes (ou maiores) da música mundial, pela ordem seguinte: Offenbach, Tchaikovsky, Brahms, Borodin, Dvorak, Manuel de Falla, Manuel de Faria – cónego bracarense -, Freitas Branco e Arturo Marquez, este último ainda vivo.
A qualidade e beleza das composições e o primor de execução (que, ao ar livre e com grande variação das condições de temperatura e humidade, exige afinação mais frequente dos instrumentos de cordas), por um conjunto de músicos maioritariamente jovens, levou o público (muito numeroso) a aprovar com distinção, aplaudindo.
Pelo que foi dito, a carteira de solicitações parece auspiciar um bom futuro. Merece-o esta jovem Orquestra (de jovens).
E Braga cumpriu, porque acorreu, apreciou e acarinhou, sob a forma de aplauso.
Estão de parabéns os artistas músicos.
E o público também, além de agradecido.

José Batista d’Ascenção

domingo, 14 de julho de 2019

Boa música em Braga. «Espiral divina»

Quinta-feira, 11 de Julho. Passava das 21.30, no topo do Monte da Consolação, em Nogueiró, nas proximidades de Braga. Iniciava-se a primeira noite da X Edição do «Castro Galaico Festival de Nogueiró, Música-Tradição-Recriação Castreja». Noite quente, sob um céu de Verão. A poente as luzes da cidade; a nascente, muito nítidas na colina atrás e à direita do palco principal, emergiam iluminados os campanários da catedral do «Bom Jesus». Um cenário a que não podia pedir-se mais. A música chegou serena e doce e ritmada e leve e harmónica pelo grupo «Espiral Trio Celta», composto por elementos femininos de grande sensibilidade, rigor e competência: uma flautista e cantora, uma tocadora de harpa e guitarra, também cantora, e uma violinista. A música é de inspiração celta, com recolhas musicais da Irlanda, da Escócia, da Bretanha e da Galiza, para além de composições próprias, com as mesmas raízes e influências. Música deliciosa, sem falhas, harmonia perfeita, de vozes e instrumentos, dando expressão à beleza das composições, sem som de «enchimento». Pena o tempo de actuação esgotar-se depressa, mas não podia pedir-se mais, porque a programação assim o exigia e talvez não o aconselhasse o «estado interessante» já avançado da harpista. Foram uma doçura em palco, um embalo, uma ternura e um encanto. Para mim, o Monte da Consolação dificilmente faria melhor justiça ao nome.
Enquanto se tratava da mudança de instrumental, actuava noutro palco o Grupo de Folclore da Universidade do Minho, em recital a que não assisti.
A música prosseguiu no mesmo palco com o grupo galego «Luar na Lubre», um conjunto vigoroso, de sete elementos, com um ritmo e volume que arrebataram a plateia, fazendo saltar para o terreiro os assistentes bailarinos que não resistiram mais à excitação das almas e às cócegas nos pés. A «culpada-mor» talvez tenha sido a cantora, de voz intensa, funda e melodiosa e o corpo possuído pela magia da dança. De tal modo que «transbordou» do palco e, por momentos, fez-se mais uma no tumulto dançante. Todos os músicos muito aplicados, precisos, fortes e síncronos. Causou-me particular impressão o virtuosismo do guitarrista.
Retirei-me antes da última música, solicitada pelo público em festa, a fim de fugir a eventual aglomeração na saída. De alma cheia.
Passadas 24 horas voltei e ocupei, praticamente, o mesmo lugar. Cerca das 22 horas começou a actuação do grupo minhoto de música tradicional, chamado, precisamente, «Origem Tradicional» (nome que me causa algum conflito cognitivo…). Composto por nove elementos, dois do género feminino: a vocalista principal e uma voz de acompanhamento. Este grupo conta quarenta e um anos e um dos seus elementos vem dos tempos da fundação. Reportório rico em música tradicional do Alto e do Baixo Minho, na sua oralidade e «gramática» mais genuínas, com um ritmo vivo, animado, dançante e dançável. O elemento mais activo na estimulação do público, para além da voz, desdobrou-se pelo acordeão, pela gaita de foles, pelo bandolim e pela guitarra. O elemento mais velho apresentou-o como «o gajo que toca tudo», o que conferiu com a sua prestação. O público entusiasmou-se, desde a criançada mais tenra, que correu e saltou o tempo todo, até aos avós dela, dançando ou bamboleando o corpo ou batendo palmas em uníssono. Uma festa, até à ovação final.
Enquanto se mudava de instrumentos, houve bombos (barulho que não aprecio), por um grupo jovem e basto, a encaminhar as pessoas para a recriação de um «casamento celta». Dispensei.
Fiquei-me a aguardar por Sebastião Antunes, artista músico e cantor de músculo firme. Os fãs acompanharam-no nas letras (com significado cívico, ambiental e político) e no ritmo, que foi imparável, cheio de energia e quase não dando espaço para os aplausos que bem mereceu. À sua direita, tinha o baixista, competente e rigoroso, e à sua esquerda um exímio e entusiasmado acordeonista. Ao fundo o percussionista, dos que merecem o nome e honram a condição. Boa música por quem sabe e sente e (a) põe em prática: com esforço e suor e convicção e engenho e arte. E agradecimento, em forma de aplauso e, sobretudo, em apreço íntimo.
Fugi antes do fim, não à música mas à multidão em movimento.
No dia seguinte não pude comparecer. Perda minha.
A destempo, não quis de deixar de tomar nota. Com um grande obrigado à organização.  

José Batista d’Ascenção

quarta-feira, 10 de julho de 2019

Dúvidas (minhas) nos critérios de classificação da prova de exame nacional de biologia e geologia da 1ª fase.

Este texto é uma adenda ao que foi publicado anteriormente

Na pergunta 8 do grupo I (sobre geologia) pede-se para os alunos explicarem a previsão, pelos cientistas, de um sismo de elevada magnitude na ilha La Española (no Mar das Caraíbas), numa zona de choque de placas tectónicas, com várias falhas activas (contexto bem esquematizado em figura ilustrativa), após um intervalo de dois séculos em que apenas se verificaram sismos de «menor magnitude» (como consta em texto introdutório), e tendo em conta «os dados da sismicidade histórica».
Na resposta exigem-se três «elementos»: (A) referir a convergência de placas ou existência de falhas activas na região; (B) mencionar a acumulação de elevadas tensões ou de grandes quantidades de energia na região; e (C) referir que, desde o último sismo violento (data no texto), «não houve libertação de grandes quantidades de energia» ou que «ocorreram apenas sismos de reduzida magnitude»
Quem falhasse um dos tópicos A, B ou C obteria apenas 6 em 10 pontos possíveis.
Ora, a primeira formulação do elemento C parece-me errada, não obstante ser fácil perceber o fundamento (válido) da sua (incorrecta) formulação. Ela estaria certa com uma ligeira modificação, por exemplo, «não houve libertação brusca de grandes quantidades de energia» (razão por que não houve sismos de elevada magnitude), já que, tratando-se de uma zona geologicamente instável, é difícil aceitar que não tenha havido no período em causa, e por junto, dissipação de grandes quantidades de energia. De resto, terá sido essa dissipação de energia, «fraccionada» em vários sismos de fraca magnitude, que terá aliviado as condições que poderiam ter originado um grande sismo. Isto mesmo tentei introduzir na discussão da aplicação dos critérios. Mas não insisti, porque o questionamento dos critérios está vedado aos classificadores.

Já no grupo II, de biologia, a pergunta 7 pressupunha que os alunos escrevessem o nome científico de duas espécies de abelhas, segundo a nomenclatura binominal, em latim, respeitando a convenção que obriga a sublinhar as duas palavras da designação científica, quando manuscritas. Não sublinhando, havia penalização (em 2 pontos).
Ora, muitos alunos esquecem-se da convenção e são penalizados. E muito bem.
Já não (me) parece aceitável que, na resposta à questão seguinte, em que os alunos tinham que explicar dois aspectos da fisiologia da abelha-comum, sem necessidade de referirem a sua designação científica (Apis mellifera), voltassem a ser penalizados pela mesma falha, porquanto a explicação nada tem a ver com nomenclatura. Além disso, em todos os anos anteriores, os erros de nomenclatura científica apenas foram penalizados uma vez em cada prova. Este ano, apesar do alvitre de muitos classificadores, foi diferente.

Só uma ressalva: do que atrás escrevi não se pense que desgostei da prova de exame. Acontece que, além doutros problemas, discordo dos critérios e do modo da sua aplicação em casos como os que referi.
Imagine-se o que senti em anos passados, em que achei as provas mal elaboradas.

José Batista d’Ascenção

Por que razões tendem a correr mal os exames de biologia e geologia

Terminou a «correcção» dos exames nacionais de biologia e geologia. Se os resultados globais forem parecidos com os da meia centena de provas que me calhou, mais uma vez ficaremos longe do desejável. Acontece que quem ler a prova provavelmente não a acha mal elaborada, nem desconforme com os programas, especialmente se comparada com as de anos anteriores. Onde procurar então as explicações do insucesso de tantos alunos? Os factores são vários e convinha identificar os principais:
- O programa de biologia de décimo ano, cujas rubricas, cada uma por si, têm interesse, carece de actualização, de articulação, de sequenciação e de adequação aos alunos a quem se destina. A indicação de «aprendizagens essenciais» limitou-o, e bem, mas não resolveu o seu carácter vago e superficial. Este programa precisava de ter sido revisto, tornando-o uma sequência lógica de conteúdos, onde, por exemplo, faria todo o sentido dar relevância aos catalisadores biológicos, que os alunos do ensino secundário não estudam, a não ser no 12º ano, caso optem pela disciplina de biologia. Se pensarmos em requisitos fundamentais para a frequência de cursos superiores de biologia, de saúde, de veterinária ou de bioquímica, parece impossível…;
- Os professores precisam de formação e actualização científica específica e de serem libertados de toda a (horrenda) burocracia não lectiva, a fim de se poderem dedicar (mais e melhor) ao ensino e acompanhamento dos alunos. O sistema de formação contínua das últimas décadas, mais virado para as exigências formais da progressão (ainda por cima congelada durante anos), em matéria de biologia, foi muito ineficaz. Diga-se que a formação inicial dos professores, implicando naturalmente a necessidade de actualização permanente, cumpriu os requisitos no domínio científico, mas iludiu os docentes no campo pedagógico. A substância da pedagogia, enquanto ciência (para além da arte que não deixa de ser), escapou à formatação infundada a que sujeitaram «levas» seguidas de professores, de que eles ficaram prisioneiros e ruinosamente expostos à mutabilidade psico-social de sucessivos universos de alunos. Todos na escola vivem e sentem isto, e muitos o afirmam, mas ninguém assume responsabilidades…;
- A feitura das provas de exame foi melhor nesta 1ª fase do que na maior parte dos anos anteriores, desde 2006. Porém, mesmo com questões bem redigidas e enquadradas com os programas, precisamos de saber se esta «arquitectura» e modo de elaboração das provas: a composição dos textos, a maneira de construir as opções, o «desenho» das sequências… e o preciosismo de certas exigências dos critérios (ver exemplos específicos em «post» seguinte) não prejudica alunos que até sabem alguma coisa das matérias, mas que por motivos neuropsicofisiológicos ou outros se afastam das respostas exigidas. Nestes domínios é que os especialistas das respectivas áreas podiam fornecer pistas úteis. Afinal o que queremos testar: se os alunos sabem ou se são proficientes a descodificar certos «estilos» de interrogação? Atenção, não se pretende insinuar a obtusidade crassa dos enunciados das provas nem se sugere condescendência para a incapacidade de escrita de muitos alunos.
No quadro dos resultados que temos vindo a obter, resta ainda uma hipótese adicional – a de os professores de biologia e geologia serem genericamente medíocres e incompetentes. Se assim fosse, não poderíamos deixar de perguntar quem e como os formou, quem os seleccionou para ingressarem no ensino e quem inspecciona a sua acção. Ainda assim, a ser verdade – e não creio que seja – melhor opção seria dar-lhes condições para poderem ensinar e demiti-los caso o não fizessem aceitavelmente. Perante tantos casos de insucesso, inadmissível é «obrigá-los» a mistificar as classificações: que os filhos dos (mais) pobres não ganham nada com um ensino que até pode diplomá-los, mas que os não prepara. E os restantes também não. Nem a sociedade. Nem o país.

José Batista d’Ascenção