sexta-feira, 28 de julho de 2023

Boas férias

Finalmente em férias. Este ano lectivo não foi mais pesado nem mais difícil do que os anteriores, mas a parte final foi menos gratificante, sem que tenha corrido mal. E o encerramento foi bom.

Neste momento, enquanto escrevo, olho a manhã cinza, mas plácida e agradavelmente tranquila. Nos dias que hão-de seguir-se procurarei mergulhar em leituras claras, belas e ricas, possivelmente mais clássicas do que modernas. Não me empanturrarei de eventos culturais formais socialmente frequentados. Evitarei multidões. E barulho. E quilómetros de estrada. Procurarei sítios do nosso país bonitos, serenos e pouco concorridos. Não desperdiçarei a boa comida, sem exageros. Desfrutarei de sãos convívios.

Vou recolher-me no conforto e na ternura de familiares e amigos, aliviando a pena de ter os netos longe.

E não gastarei muito tempo nas redes sociais.

Parece-me bastante razoável, este (meu) programa (de intenções), que mereceu a concordância dos próximos.

Boas férias, mesmo para os muitos que as não podem gozar.

José Batista d’Ascenção

domingo, 9 de julho de 2023

O cérebro e a faculdade de aprender

Referências ao livro “Deus Cérebro” desencadearam em mim grande vontade de o ler. Foi uma leitura interessante, à procura de soluções para perguntas de há muito, que continuam sem resposta. Suspeitava-o, li com voracidade e confirmei. Mas valeu a pena.

Interesso-me, como comum mortal, pelo entendimento de como é que a matéria se organiza e pensa e sente e se questiona a si própria, com base em correntes electroquímicas de iões de sódio e de potássio (processos que parecem bastante monótonos e idênticos) em células que chamamos neurónios, e nas múltiplas comunicações entre esses neurónios (sinapses) feitas por cerca de uma centena de moléculas a que chamamos neurotransmissores. Se é tudo tão básico e tão parecido, como é que, com base nesses circuitos, eu oiço e vejo e sinto e sonho e amo e penso no futuro? Mistérios. Se «o Universo criou o cérebro humano para se ver a si próprio» (p. 217), também faz sentido que o cérebro se estude a si mesmo, matéria da neurociência. O cérebro, o corpo, o planeta, o universo e toda a matéria que existe são feitos da mesma massa, pois que são constituídos pelos mesmos 118 elementos químicos. Mas falta «descodificar o cérebro humano» (p. 118), de que «não sabemos coisas básicas» (p. 151): «ainda estamos na idade das trevas quando se trata da ciência do cérebro» (p.152). 

Aqui residem grandes dúvidas relacionadas com a minha profissão: sou professor (do ensino secundário, de biologia, ainda por cima) e interessa-me o estudo das redes neuronais como «chave para a compreensão da função cognitiva» (p. 156), ou confirmar a que «também é a chave para o cérebro humano: prática, prática, prática» (p.95) ou saber porque é que «as crianças aprendem mais rápido do que as pessoas mais velhas» (p. 97) ou destacar o papel da memória - «claramente a capacidade mais importante que temos» (p. 104), entre outros motivos que possam traduzir-se em desempenho mais eficaz e gratificante da docência.

Na realidade, a prática de quase 40 anos de ensino foi reforçando em mim a ideia de que a maior parte das “teorias” e metodologias de aprendizagem são bastante vácuas e falhas, pelo que se desdobram/sucedem/multiplicam sem resolver problemas prementes crónicos (o que não desmerece o trabalho de grandes pedagogos, apenas não lhes oculta os limites e, muito menos, legitima deficientes versões e adaptações “caseiras” do seu legado). Por consequência, os professores tornam-se náufragos de fórmulas e procedimentos que têm fundamento idêntico ao que teve a prática médica de realizar sangrias ou aplicar sanguessugas durante muitos séculos.

José Batista d’Ascenção