quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Por falta de amor às árvores e à floresta

A autoridade tributária fez-me chegar via e-mail, a mim como a outros contribuintes, uma mensagem de esclarecimento e apelo à limpeza obrigatória de matos e árvores na proximidade de casas e povoações. A mesma mensagem está também a ser divulgada em redes sociais como o facebook. Fundamentalmente, reza o seguinte:
…«limpe o mato 50 metros à volta da sua casa e 100 metros nos terrenos à volta da aldeia. (…) Se não o fizer até 15 de março, pode ser sujeito a processo de contraordenação. (…) as Câmaras Municipais podem substituir-se aos proprietários na limpeza do mato. Os proprietários são obrigados a permitir o acesso aos seus terrenos e a ressarcir a Câmara do valor gasto na limpeza.»
Por praticamente não ver televisão, desconheço se aquela mensagem está a ser divulgada através RTP. Também não sei se estará a sê-lo via RDP.
Tenho pena que as acções preventivas de incêndios não tenham sido iniciadas há meses, mas mais vale tarde do que nunca. A pressa não é boa conselheira e as medidas propostas são um procedimento de emergência, com fundamentação questionável até do ponto de vista ambiental.
Isso me transmitiu o meu querido e estimado Professor de sempre, Jorge Paiva, antes de mais uma partida para os trópicos onde vai ficar vários dias. Referia ele, com tristeza e alguma revolta, o trabalho de longo alcance e de longa duração (muitas décadas…) que é preciso realizar para termos florestas sustentáveis ecológica e economicamente, em contraste com o improviso e sempre o economicismo imediato e rapace ou o mero oportunismo ignorante dos agentes que deviam estar interessados numa outra gestão agro-florestal mais amiga das pessoas, da biodiversidade (sem a qual os humanos não vão sobreviver) e de um desejável equilíbrio ambiental de que dependemos estritamente. É que a Natureza não precisa do ser humano, nem deixa de existir nem de evoluir sem a espécie humana que (como qualquer espécie biológica) não é eterna. E tempo não lhe faltará para isso, ao invés da satisfação das exigências que a cada momento se colocam à sobrevivência das pessoas: alimento, disponibilidade de água e de oxigénio, condições de temperatura e de humidade atmosférica, etc. Alerta-nos, e bem, o Professor Jorge Paiva, de que precisamos de «serviços florestais», que já tivemos e deixámos de ter, como precisamos de plantar árvores e de (re)florestar com perspectivas de futuro (o que esbarra em interesses económicos imediatos), abandonando regimes monoespecíficos de pinheiros (chegámos a ter a maior mancha contínua de pinheiro bravo da Europa) e de eucaliptos (que atingiram já a maior densidade de exemplares em termos mundiais relativamente à superfície do país), plantas estas que são altamente inflamáveis. Também é preciso que as populações possam lidar e viver com a (e da) floresta, enquanto fonte de recursos diversos, desde os imprescindíveis à fisiologia e à saúde aos económicos, mas respeitando sempre as leis da Natureza.
Assim mesmo, dado o desleixo a que chegámos e o perigo que matos, pinhais e eucaliptais representam para a vida das pessoas que vivem no interior ou viajam pelas suas estradas no Verão, é preciso começar por algum lado, pelo que dou por bem-vindas aquelas medidas, enquanto procedimento de emergência. E bom seria que os autarcas que as põem em dúvida, reclamando dinheiro, equipamento e tempo, pusessem mãos à obra e fizessem tudo o que seja possível enquanto o Verão não chega. De resto, se há tanto por fazer, isso também se deve à indiferença a que têm votado o assunto, só comparável ao desprezo e incúria dos governantes por uma tão grande área do país e pelas poucas e envelhecidas gentes que (ainda) lá habitam.
À minha amiga Aida Reis, que foi engenheira agrária dos quadros do ministério da agricultura, técnica competente e dedicada, e que morreu precocemente há não muitos meses, ouvi um dia dizer que «os portugueses não gostam de árvores». Realmente, quem olha para as nossas florestas ou repara nas margens de estradas nacionais ou nas «podas» (!) que se fazem nas árvores das nossas vilas e cidades, não pode deixar de concordar. Desbaratamos e desperdiçamos o que é uma riqueza fundamental, no presente e no futuro.
Os portugueses em geral parecem não relacionar as árvores com ar puro, temperaturas amenas, humidade do ar e dos solos, protecção contra a erosão, abrigo e habitat de imensa biodiversidade, senão como fonte de rendimento material imediato o qual, se não for materialmente lucrativo, dá lugar a abandono radical. Em consequência, resta a exploração intensiva de madeiras e a «indústria do fogo», que proporcionam negócios rendíveis que levam ao esgotamento dos recursos e à exaustão e destruição do território, em termos paisagísticos, ambientais e económicos.
Qual a eficácia com que vamos lidar com tamanho problema nos meses próximos é pergunta para que não temos resposta, mas que inspira as maiores preocupações, porquanto, ainda ontem, nas notícias das 08.00 horas, na rádio «Antena Um», se referia com ênfase e preocupação o estado de seca, nalguns casos severa, em que se encontram os solos do país e a baixa do armazenamento de água em barragens, devido à falta de chuva que precisávamos que ocorresse continuamente durante meses.
Como vai ser o próximo Verão, em matéria de incêndios?

José Batista d’Ascenção

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