sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Espírito natalício e natal comercial

Imagem adaptada, a partir daqui.
Há no fundo do coração humano um lastro intrínseco de bondade, que devemos estimular permanentemente e fazer vir ao de cima, tanto quanto possível, ou os esforços para sermos bons são isso mesmo: esforços que precisamos de cultivar (em nós e nos que educamos) para que não nos «canibalizemos» uns aos outros, desde as origens e para (todo) o futuro da espécie, como a História da humanidade parece demonstrar? Por outras palavras, há bondade constitutiva nos seres humanos, pelo menos em parte deles, ou, na realidade, o que predomina é mais um «verniz» que nos permite ir vivendo com a sociabilidade possível?
Sou pela primeira possibilidade, por pensar em tantas pessoas que conheço. O espírito desta ideia, em relação com a quadra, encontrei-o na releitura da história assombrada de «Ebenezer Scrooge» e principalmente dessa outra «...história de duendes sobre uns sinos…», do mesmo autor, a que voltei por estes dias.
Não fossem os mais próximos, entre familiares e amigos (que são outro modo de ser família), em especial os mais pequeninos, particularmente quando inocentes, e o Natal ou seria um acto de fé penitencial ou um artifício variável na escala entre o prazer e o sofrimento. Mas, em família, com os meninos, pelos meninos e para os meninos, o Natal torna-se autêntico, profundo e comovente. E até os adultos podem voltar à infância, de preferência sem infantilidade, e emprestar-lhe a sinceridade que a inocência das crianças justifica. E então o Natal é uma festa, bela, terna e reconfortante.
É porém excessivo o que podem hábitos, cicatrizes e vícios, enquanto marcas do tempo e das vivências. O egoísmo e a ganância medram e expandem-se em todos os tempos, e emergem, com ou sem disfarce, a cada momento. Pelo Natal também. Então, para quem pode, é uma correria à procura do que se precisa e (fundamentalmente) do que não se precisa, para dar vazão a ânsias e instintos de consumir, consumir, consumir: no que se deseja, no que se pede, no que se exige, no que se dá, no que se recebe, no que se exibe e, até, no que se esconde ou não se quer ver. Fabricamos necessidades, mesmo com o argumento de suprir as necessidades de quem as tem verdadeiramente (e que não é, normalmente, quem mais se faz ouvir ou notar). Da Natureza extraímos tudo o que se pode converter em dinheiro. E pelo dinheiro destruímos infindavelmente o equilíbrio da Natureza, a saúde e o relacionamento das pessoas e também, imagine-se!, a economia das sociedades. Em extremo, fabricam-se armas e recorre-se à guerra. De todo o modo, enchemos o planeta de lixos e venenos, em contraposição à esperança que sempre colocamos em dias melhores. E, ao bem-estar de quem pode e manda, normalmente poucos, corresponde a penúria dos desprotegidos, tendencialmente muitos. É certo que a sociedade dita ocidental, que estatuiu os direitos humanos, é, apesar disso, a melhor que conseguimos, fruto de notáveis progressos científicos e culturais. Mas não o é para todos e tem crises de regressão, que exigem que não desistamos de praticar e de perseguir o bem comum.
Pelas crianças, no mínimo.
O Natal é sempre Natal.
Festas Felizes. 

José Batista d’Ascenção

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