quinta-feira, 8 de maio de 2025

Donos do mundo

Epílogo do livro «Humano, Demasiado Humano», de Neil D. Lawrence (p. 481-492)

Há empresas de tecnologia que implantam sistemas de software que não podem ser controlados pelos seus criadores. O software é frequentemente dividido e construído por diferentes equipas, o que tem o infeliz efeito colateral de ninguém entender como funciona todo o sistema, dado que a complexidade do todo pode tornar-se excessiva para a compreensão de qualquer indivíduo. Quando corre mal, os efeitos podem ser devastadores.

Assistiu-se a um fenómeno deste tipo quando os sistemas do Facebook foram manipulados para espalhar desinformação nas eleições dos EUA em 2016. O próprio Facebook exigiu uma investigação de dez meses para entender até que ponto os seus sistemas tinham sido manipulados por uma instalação de trolls russa.

Em 2019, Mark Zucherberg escreveu um artigo no The Washington Post em que pedia a regulamentação das redes sociais. As instituições e os indivíduos em quem confiamos foram debilitados pelos aprendizes de feiticeiro modernos. O computador é uma infra-estrutura de informação dos nossos dias, desenvolvida por um novo tipo de escribas – os engenheiros de software das grandes empresas de tecnologia. Porém, “libertam” uma tecnologia que não conseguem controlar.

Esta é uma situação desesperada e está a piorar. Com o surgimento do ChatGPT, em 2022, substituiu-se o grande homem pelo grande computador.

A moderna infra-estrutura da informação pode propagar-se vertiginosamente: há mais de uma década, a OMS e a ONU estimaram que em todo o mundo havia mais pessoas com acesso a telemóveis do que a instalações sanitárias.

A grande falácia da “inteligência artificial” reside em considerar que a tecnologia de automação se adaptará a nós, em vez de nós nos adaptarmos a ela, porém, essas ferramentas não são implantadas para capacitar o indivíduo, mas para capacitar corporações.

A ameaça que enfrentamos hoje é uma forma de totalitarismo da informação que advém da oligarquia digital.

Devemos tentar reequilibrar o poder das guildas de software para as pessoas e as instituições de sociedades abertas.

José Batista d’Ascenção

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