sábado, 7 de julho de 2018

A necessidade de escrever

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Por que é que muitas pessoas comuns (como eu) têm necessidade de escrever, sobretudo quando (praticamente) não têm leitores? Para dialogarem consigo próprias? Para deixarem testemunho do que pensam ou sentem? É uma forma de lidar com a solidão? Para, de algum modo, se justificarem perante si mesmas ou em relação aos outros? São questões várias que talvez deixem de fora o principal: o impulso e o prazer de comunicar, o fascínio da palavra escrita, o desafio de conceber e aprimorar um texto sobre qualquer assunto, o discorrer sobre algo que se conhece bem ou nem por isso…
Na realidade, salvo aos que lhe são queridos, as pessoas em geral não tem nada de relevante para dizer, não obstante a inevitável (e preciosa) originalidade (mesmo que banal…) de cada um. Aliás, se só os que têm algo a acrescentar à vulgaridade escrevessem, havia menos extensão de textos e mais fácil seria (aos restantes) encontrar, desfrutar e beneficiar de escritos com interesse. Pelo meio, tinham-se aliviado quilómetros de estantes com livros inúteis e gasto menos biomassa vegetal na produção de papel. O problema da falta de espaço e do consumo de papel está agora (e cada vez mais) resolvido com a tecnologia digital e o arquivamento informático, por conteúdos e/ou por autores, datas ou lugares, mas é sempre um aumentar do volume de textos inúteis ou vazios que não facilita a descoberta do que vale a pena ler, pelo menos enquanto os motores de busca forem, como ainda são, insuficientemente «inteligentes».
E o que vale a pena ler? A questão não tem resposta única e universal. A arte, a beleza, a ciência ou a racionalidade não são o mesmo nem para os espíritos (mais) brilhantes, quanto mais para os seres humanos normais. Por outro lado, os seres humanos comummente não se movem tão diligentemente por princípios e por boas intenções como por interesses e por paixões. Assim mesmo, a humanidade fez progressos notáveis, sempre que foi possível aprender eficazmente, sobretudo as leis naturais e os seus fundamentos científicos, e definir regras e procedimentos com base na cooperação e no respeito, o que resulta em benefício de todos. Mas isto é difícil de conseguir e de interiorizar, porquanto exige um forte sentido de educação e de aperfeiçoamento, primeiro na família e depois na escola e na comunidade. Naturalmente, o fim último da existência e a justificação para o funcionamento e evolução do mundo escapam à compreensão humana, abrindo espaço para a essência religiosa e transcendental, que dificilmente não acompanhará o ser humano enquanto a espécie existir. Seja como for, as sociedades humanas não dispensam a partilha de um conjunto de valores e de conhecimentos. Mas, esses valores e conhecimentos aprofundam-se melhor limitando-nos ao supra-sumo do que já foi escrito e à produção dos espíritos luminosos que continuam a escrever ou à variação das opiniões do maior número de pessoas possível?
Os que crêem, apesar de saberem que «a Deus nunca ninguém o viu», talvez tenham mais facilidade em aceitar o mundo tal como é, mas as realidades do universo não se compreenderiam mediante o refúgio em qualquer ideia de Deus que dispensasse o Homem de pensar, fosse qual fosse a religião ou seita que a propusesse.
Por isso, cabe-nos ir vivendo e parece-me melhor opção considerar o contributo de todos. Contributo que se faz de muitos modos, e um dos mais privilegiados será a escrita. Ora, o volume da escrita pode e deve acolher até os textos mais humildes, em que sempre haverá alguma utilidade, ainda que fugaz ou ilusória, e eventualmente restrita aos escreventes.
Em suposto benefício da comunidade humana, cujo futuro desconhecemos.
E sobre o qual não vale a pena interrogar os líderes carismáticos do Mundo.

José Batista d’Ascenção

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